Em rigor não existe em outro idioma equivalente que diga com exatidão, vigor e poesia, o que nos diz, em português, a palavra saudade.
Ela traduz o mais comovente dos sentimentos humanos, o mais dilacerante, o mais doloroso, a lástima da ausência, a tristeza da partida, o inevitável das perdas e das separações. Insisto: só em língua portuguesa, que me perdoem os que forem buscar nos subterrâneos da etimologia e das possibilidades de tradução o sinônimo perfeito para o vocábulo com que definimos o que se sente na ausência da coisa amada, o que dói no fundo da alma quando desejamos conosco aquilo que se foi, ou ficou, enquanto partimos.
Está na pedra dos túmulos, no coração dos viajantes, dos exilados, dos solitários e dos esquecidos. No poema dos apaixonados.
Em Canção de Amor, um clássico do cancioneiro popular, Elano de Paula diz: “Saudade, torrente de paixão/emoção diferente, que aniquila a vida da gente,/uma dor que não sei de onde vem…”
Chico Buarque, em Pedaço de Mim, encontrou com sua genialidade poética a expressão que diz do sentimento: “A saudade é o revés de um parto/A saudade é arrumar o quarto do filho que já morreu”.
Fausto Nilo, em Asa Partida, traz os versos antológicos: “E continua o teu sorriso no meu peito,/esta saudade, o cigarro, a luz acesa/e esta noite posta sobre a mesa”.
A poesia diz figuradamente, transmitindo ao outro, o que parece incomunicável. O prodigioso poder da literatura! O milagre que só a arte é capaz de operar!
Que dizer de Brant: “Amigo é coisa pra se guardar/do lado esquerdo do peito/dentro do coração/mesmo que o tempo e a distância/digam, não”.
Ou Duran, que, à falta de um lápis, escreveu a batom, no espelho: “Ah, a rua escura, o vento frio/esta saudade, este vazio/esta vontade de chorar”.
Dia desses, conversando com amigos, ainda quando era dado sentar à mesa para conversar, o tema veio à tona: “É o doloroso gozo!”, alguém falou, arrancando da memória a contradição.
É que não existe saudade que possa, por inteiro, aliviar a dor, mesmo quando a sentimos daqueles que amamos – e vão chegar! Da viagem de que nunca vamos esquecer, do beijo doce, dos dias felizes, da boa infância, do primeiro amor.
Há, no entanto, a saudade que é ferro em brasa atravessando o coração, que é ácido na ferida aberta, que traz consigo a sentença inassimilável: “Nunca mais!”
O sentimento que não é mi mi mi, como professam os monstros!
Álder Teixeira é Mestre em literatura Brasileira e Doutor em Artes pela Universidade Federal de Minas Gerais
0 comentários