Vera Luccia del’Anima, a Condessa.
De Veneza era o sol, altiva e bela;
Mirava-se no espelho, qual na tela
O pintor faz que a vida apareça.
Jovem, desejada, voluptuosa;
Nem de Narciso o olhar brilhava tanto.
Não pertence ao instante, qual a rosa
Que o fim da tarde vem fadar-lhe o encanto.
A alcova luxuosa e ela, despida,
Olhava-se… A Beleza em seu poder!
Aquela Luz teria sempre a vida?
Olhava-se… e o dia a fenecer..
“Que te parece, amor, não sou divina?”
Ela indaga ao amante, que a fitava.
E o seu cabelo a brisa vespertina
Pela janela, suave, afagava…
Silencioso, o amante, reclinado
Tinha a visão mais pura e cristalina.
Mas a Verdade o manteve calado.
“Que te parece, amor, não sou divina?”
Outra vez perguntou, quase nervosa;
Mas ele silenciou. Fixo o olhar.
Ele tinha a alma antiga e tortuosa;
Funda tristeza o fazia sonhar…
“Não me respondes! Já de mim te enfadas?
Quero ouvir teus secretos pensamentos.
Que palavras tão sérias na alma guardas?
Por que ao olhar-me mostras desalentos?”
Disse o amante: “Esta que vês não és!
Os olhos enganam e a carne mente.
Há Algo Maior. Sequer chegas aos pés!
O espelho oculta e te confunde a mente.
Não és esta beleza que em poeira
Um dia a terra te há de tornar.
És Alma e não a sombra derradeira;
És Sol e não a vela a se apagar!
Não te engane a vaidade, brisa vã.
São apenas centelhas os sentidos.
Além do corpo há um profundo afã,
A Música de sons jamais ouvidos!
A que amo jaz em ti, doce semente,
Que há de florir quando a morte passar.
Pois esta não és tu. Estás ausente.
A morte e não a Vida estás a olhar!”
A Condessa calou após ouvir.
A face pensativa, inda a mirar-se;
Talvez algum enigma julgasse.
Mas o estranho amante deixou partir.
No espelho demorou-se, indiferente
À Verdade, remota qual paisagem.
Não era a Luz da Alma à sua frente.
Era sombra! Era ilusão! Era miragem!!!
Professor Doutor Everton Alencar
Professor de Latim da Universidade Estadual do Ceará (UECE-FECLI)
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