Entrevista: Márcia Vannusa Vieira – Nutricionista

12/02/2022

Nesta edição do A Praça, pausa para uma conversa franca com a nutricionista Márcia Vieira, especialista em nutrição na Atenção Básica. Ela fala sobre as doenças crônicas e suas consequências, a contribuição da alimentação no controle e prevenção das doenças, e as mudanças de hábitos como pontos determinantes para melhoria da qualidade de vida

A Praça – Quais são as principais doenças crônicas que mais afetam a população?

Márcia – As doenças crônicas, e aqui eu vou usar a definição do Ministério da Saúde, são doenças de longa duração ou que não têm um tempo definido para cura, causadas por muitos fatores e que, na sua maioria, têm controle, mas não têm cura. São exemplos de doenças crônicas a diabetes, hipertensão arterial, obesidade, entre outras. Essas doenças são as que mais preocupam as entidades de saúde porque são as que mais provocam mortes no mundo, e além disso são responsáveis por provocar outras doenças crônicas como as cardiovasculares (infarto, acidente vascular cerebral – AVC tromboses), falência renal, entre outras.

A Praça – Quais as consequências disto do ponto de vista dos custos com a saúde?

Márcia – Isso gera um custo muito grande para o Sistema de Saúde com medicamentos e tratamentos a longo prazo. A hipertensão arterial e a diabetes ‘melitus’ são doenças muito prevalentes na população. Segundo o Ministério da Saúde do Brasil, em 2019 mais de 1,5 milhões de pessoas tinham diabetes e mais de 5 milhões de pessoas hipertensão arterial. Isso é muito preocupante, principalmente quando percebemos, que essas doenças estão aparecendo a cada dia mais em crianças, adolescentes e adultos jovens.

A Praça – Existe uma causa direta para explicar esses fatores causadores dessas doenças?

Márcia – Na realidade, a hipertensão, diabetes e outras doenças crônicas são ocasionadas por diversos fatores como obesidade, sedentarismo, alimentação inadequada, tabagismo, alcoolismo. Por isso são nesses fatores que devemos investir para prevenir e controlar essas doenças.

A Praça – Quais as contribuições que uma boa alimentação pode gerar na qualidade de vida das pessoas e no controle dessas doenças?

Márcia – Uma alimentação saudável, eu diria, que é o princípio de mudanças que deve existir para promover uma melhor qualidade de vida. A alimentação tem correlação com o bem-estar físico, mental e social de um indivíduo. Ou seja, quando se tem uma nutrição adequada, se tem o intestino e o sistema imune funcionando adequadamente, um maior controle das taxas de gordura, sódio e açúcar no sangue, e consequentemente, um equilíbrio maior no funcionamento de tecidos e órgãos. Dessa forma, uma boa alimentação tem, sem dúvida, um papel fundamental na prevenção das doenças crônicas.

A Praça – O que a fez identificar essas diferenças?

Márcia – Nos dias de hoje, percebemos uma inadequação preocupante na qualidade da alimentação da nossa gente. Estamos deixando de comer os alimentos da nossa roça e no lugar desses estamos colocando produtos processados que vêm em pacotes ou latas. Esses são, sem dúvida, um dos grandes vilões de alimentação e que precisam ser restritos na nossa comida. Em contrapartida, consumir frutas e verduras diariamente é um fator protetor contra o aparecimento da diabetes e hipertensão.

A Praça – Em algumas situações, você já foi questionada sobre esses efeitos; ou seja, as frutas, legumes, verduras contaminadas que podem gerar danos à saúde? No caso dos agrotóxicos?

Márcia – Muita gente me questiona quando apresento essa fala dizendo:  mas doutora as frutas e verduras estão cheias de agrotóxicos. Realmente, com o modo de produção de temos hoje é quase impossível consumirmos frutas e hortaliças sem veneno, porém os benefícios de seu consumo diário superam, ainda, o risco dos agrotóxicos. Além disso, existem madeiras de reduzir esse consumo como a higienização adequada e também comprar esses alimentos na feira, de pequenos agricultores.

A Praça – Quais são as dicas em relação ao consumo de sal e açúcar, tipo aquele ‘saleiro’ e aquele ‘açucareiro’ em cima da mesa?

Márcia – Eu diria que para uma boa alimentação nem é preciso manter esses utensílios lá. Então a ideia é tirar a ‘saleira’ e ‘açucareira’ da mesa mesmo. O sal e o açúcar em excesso também são vilões da alimentação saudável. Eu sempre digo para os meus pacientes que não precisa tirar o sal da dieta, o sal é importante para realçar o sabor dos alimentos, porém o seu consumo excessivo, principalmente, por meio de temperos industrializados, embutidos como linguiça, salsicha, mortadela, carne de lata, salgadinhos e os que vêm enlatados predispõe doenças. Além disso, esse tipo de alimento ainda conta com conservantes, aditivos químicos e gorduras ruins que prejudicam a saúde. Então a dica é: prefira temperos naturais e alimentos com o mínimo de processamento possível. Em relação ao açúcar é interessante trocar o açúcar branco pelo mel de abelha, pois o mel tem propriedades fascinantes que contribuem com a melhora da imunidade, é antioxidante, além de ser rico em vitaminas e minerais. Para quem não quer largar o açúcar o ideal é realizar sua diminuição gradativa: por exemplo, se você usa três colheres de açúcar no café, reduz para duas e assim até ficar amargo, isso vale para todas as preparações do nosso dia a dia. No início o sabor por ser estranho, mas o paladar acostuma muito rápido, digo isso por experiência própria. Ressalto também que pessoas diabéticas devem tomar cuidado com o consumo de mel, açúcar Demerara, açúcar Mascavo, por serem alimentos ricos em açúcar. Pode substituir também o açúcar pelos adoçantes naturais como o stévia ou sucralose, porém esses adoçantes devem ser consumidos com moderação por risco de danos à saúde, recomendo em média 6-12 gotas/dia.

A Praça – Algumas pessoas estão substituindo a margarina pela manteiga da terra. Por que motivo?

Márcia – A substituição da margarina por manteiga, pode ser porque a manteiga da terra tem um valor mais em conta. Por outro lado, a margarina tem um tipo de gordura chamada gordura hidrogenada, que pode trazer grandes malefícios para as nossas veias e artérias, e o que percebo é o uso indiscriminado pela população. Além disso é importante evitar frituras e carnes gordas; prefira alimentos cozidos ou grelhados e carnes mais magras.

Em relação aos produtos lácteos o indicado é que sejam desnatados ou pelo menos semidesnatados, ferver nosso leite de casa realizando o desnate várias vezes já contribui.

A Praça – O Guia Alimentar do Ministério da Saúde para a população brasileira traz recomendações importantes sobre, por exemplo, o ‘ato de comer’, para se ter uma alimentação mais tranquila, saudável, num ambiente mais harmonioso, sem ‘intrusos’. O que acha disso?

Márcia – Para uma alimentação adequada, segundo o Guia Alimentar para população brasileira são: coma em companhia e não acessando o celular ou de frente para televisão. prefira os alimentos regionais comprados na feira, o que vai incentivar a nossa cultura alimentar e a nossa economia local e beba pelo menos dois litros de água por dia. Sendo assim, a base da alimentação para tratar e prevenir que essas doenças se agravem e gerem maiores consequências à saúde é a basicamente a mesma que ressaltei anteriormente. É claro, que o portador de diabetes deve tomar mais alguns cuidados para o controle rigoroso dessa doença, elemento fundamental para evitar danos a órgão alvos como o sistema cardiovascular e os rins.

A Praça – Falando francamente, nutricionista, o que é preciso evitar?

Márcia – Falando sinceramente, deve-se evitar o excesso de massas como arroz, macarrão, tapioca, biscoitos, pães, cuscuz. Ressalto que deve existir um maior controle desses alimentos. Não falo em ‘proibido’, mas sim, um consumo adequado. O plano alimentar dependerá das individualidades de cada um. Outra questão importante é a qualidade dessa massa, as massas integrais têm uma maior quantidade de fibras, o que ajuda no controle do açúcar no sangue.

A Praça – De acordo dados dos órgãos oficiais, o consumo de peixe dos brasileiros está muito aquém do desejado. Isto deveria melhorar?

Márcia – A população brasileira apresenta um grande consumo de proteína de origem animal como ovo, frango, carne vermelha representada pela carne de porco, boi, ovelha, cabra e o peixe, o qual não é consumido como deveria pelo povo brasileiro. A carne vermelha, dentre todos as outras, tem uma quantidade maior de gordura saturada, que traz malefícios a saúde dos nossas vasos e artérias predispondo a um maior risco de doenças do coração e sistema vascular. Já o peixe tem um tipo de gordura denominada gordura poliinsatura (ômega 3 e ômega 6) que trazem benefícios positivos em relação à proteção do sistema cardiovascular e cerebral. Então, o consumo de peixe deve sim ser mais frequente pela nossa população, o ideal seria duas vezes por semana, tendo em vista esses benefícios. Ressalto que evite o peixe frito e prefira o cozido, grelhado ou assado.

A Praça – O consumo das frutas com maior teor de açúcar deve ser moderado também?

Márcia – As frutas com um maior teor de açúcar como banana, manga, essas frutas devem ser consumidas em pequenas porções e uma dica é que seja na sobremesa. Destaco também que a alimentação é um dos fatores importantes para a prevenção e controle das doenças crônicas, mas é importante ressaltar que a adoção de um estilo de vida saudável com a prática de atividade física regular, controle do tabagismo, alcoolismo, estresse, é essencial para prevenir e tratar doenças. Desse modo, deixo uma frase que gosto muito da nutricionista Francine Lima: “você é o que você sabe sobre o que come”. Então, busquem em fontes confiáveis sobre o tema alimentação, o Brasil tem um guia gratuito que traz informações importantes sobre como se alimentar bem. Vou deixar o link para quem tiver interesse e curiosidade sobre o conteúdo: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_alimentar_populacao_brasileira_2ed.pdf

Perfil

Marcia Vannusa Vieira, nutricionista formada pelo Instituto Federal do Ceará – IFCE, com atuação na Prefeitura Municipal de Iguatu; nutricionista do Centro de Nefrologia do Iguatu; professora do curso de Nutrição da Faculdade São Francisco do Ceará – FASC,

Mestre em Ensino na Saúde pela UECE, especialista em Nutrição na Atenção Básica à Saúde, e especializanda em Nutrição e Doenças Renais. Atendimento em saúde coletiva e doenças renais.

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