Pablo Bandeira (Economista)
Há umas semanas as coisas aqui em casa começaram a quebrar. Teve quadro que caiu, guia que partiu, máquina de lavar que deu defeito, planta que morreu, comida que estragou, Cacau (a cachorra) que adoeceu e eu que fui na onda adoeci também. Tudo sem um motivo óbvio. Os olhos se irritando diuturnamente, um começo de anemia, minha parceira de anos, as costas doendo dia sim e no outro também. Má gestão do meu sempre pouco tempo, más notícias chegando, incapacidade de dormir uma noite inteira.
Minha vó sempre me chamava para conversar nos dias que antecediam esses males súbitos e, para minha irritação, cedo tarde se descobria que a morbidade de fato ali estava e seu olho, já tanto danificado por uma conta de uma das cirurgias que ela deixou de fazer parecia feito precisamente para identificar os movimentos secretos que nem eu mesmo saberia reconhecer. Dessa vez, não busquei o olhar reconfortante da minha vó. Então, como sempre e sem um motivo aparente fui tomado por um desses esgotamentos que enfraquecia tudo à minha volta.
Uma angústia, sempre ela, sempre a mesma, consumindo minha energia até o limite do paralisante. Dias inteiros de pijama no sofá bebendo chá mate e vendo show de drag queen enquanto o tempo se arrasta e mesmo assim passa rápido demais. Os shorts sujos que só dois dias atrás criei força para colocar na máquina de lavar, café para o almoço, uma piora geral de tudo.
Ora tristeza, ora enxaqueca.
A própria tristeza parece bonita no espelho, é um lugar quentinho, a desculpa vem fácil: não quero, não posso, não agora, não sei, não consigo. É preciso um tapa, uma ducha fria, um susto para despertar e sair dessa.
Bem, ele veio numa terça-feira de sol em que eu, no meu otimismo infinito, pensei que dava pra esticar mais um pouco, não é pra tanto, vai dar pé, insistir faz parte, me deixa tentar, prometo que vou fazer tudo ficar bem. Não para sempre, que isso não existe, mas é que ainda é cedo.
Não era. Declínio exposto, só faltava ver. Data de validade expirada e o que quer que seja que estivesse guardado na embalagem tinha azedado. E não azedou pouco, não. Mas tudo bem. As pessoas, elas mudam. Mudei junto e ao invés de lutar contra que é o que eu faço normalmente, decidi seguir o fluxo e aceitar o que o tempo impõe.
Agora, em outro dia, uma sexta-feira de sol, vejo que as plantas voltaram a crescer depois que eu dei um amor para a terra e tirei as folhas mortas. Consertei a máquina de lavar. Faz uns dez dias que não deito no sofá, o sol entra pela janela e escorre pela sala, Cacau se estica no tapete limpo para receber calor, a estante de livros está arrumada. O coração não vai ficar afundado pra sempre e a inspiração vai voltar – ela sempre volta.
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