“Os níveis elevados de glicose no sangue podem levar a sérias complicações visuais, renais, amputações de membros inferiores, doenças cardíacas e cerebrovasculares.”
Dr. Rogério Couras
Nesta edição do A Praça, o leitor acompanha entrevista com o médico endocrinologista Rogério Couras, por ocasião do Dia Nacional do Diabetes, lembrado em 26 de junho. Na entrevista, o médico tira dúvidas sobre a doença silenciosa, suas causas, efeitos e consequências sobre a população
A Praça – O Dia Nacional do Diabetes, celebrado no último dia 26/06, traz alerta sobre o aumento do número de casos da doença com diagnóstico fechado, e quase 17 milhões de pessoas acometidas. Este crescimento pode significar que as pessoas estão se cuidando menos?
Dr. Rogério – Isso se deve a uma junção de fatores: aumento da incidência/prevalência do sobrepeso/obesidade, que aumenta as chances de DM, a melhoria na qualidade da Saúde Pública, com diagnóstico mais precoce e instituição de tratamento já na fase de ‘pré-diabetes’, o fato de a população mundial estar envelhecendo e esse envelhecimento não está sendo tão saudável quanto se espera – alimentação não-saudável e sedentarismo, por último, as melhorias na qualidade das notificações da doença, ao nível da atenção primária.
A Praça- Existem dois tipos de diabetes: 1 e 2. Qual a diferença entre os dois tipos?
Dr. Rogério – O DM1 seria secundário a uma deficiência na secreção de insulina, pelo pâncreas. A insulina é o hormônio que permite que as células do nosso corpo aproveitem a glicose como substrato energético. O DM2 seria secundário a uma resistência a ação da insulina nos tecidos, associada, com o passar dos anos, ao prejuízo parcial na secreção da insulina pelo pâncreas. O DM1 é mais comum, antes dos 14 anos, e o DM2 por volta dos 40 anos. O DM1 pela deficiência na síntese e secreção de insulina pelo pâncreas precisa usar insulina exógena. O DM2 pode ser tratado com fármacos orais, mas dependendo da gravidade do caso e do grau de deficiência de secreção da insulina pelo pâncreas, precisa ser insulinizado. Lembrando que existem outros tipos de diabetes mais incomuns.
A Praça – De acordo com a Federação Internacional de Diabetes (IDF), os números crescentes da doença no mundo estão impulsionados por uma combinação de fatores, socioeconômicos, ambientais, geográficos e genéticos. O senhor vê relação nisso?
Dr. Rogério – A genética é bem mais influente entre os DM2. O DM1 pode ter uma relação parental em até 25% dos casos, segundo algumas casuísticas. As chances de filhos de pais com DM2 também serem portadores da patologia podem chegar a 80%, em especial se esse filho for sobrepeso-obeso. Vemos hoje que a obesidade é um importante problema de saúde pública, estando diretamente relacionada ao DM2 – cerca de 75% dos DM2 são sobrepeso-obesos. Assim sendo, nosso estilo de vida associado a uma genética favorável, pode levar ao DM2 – aumento do consumo calórico, em especial por parte das crianças, aliado ao sedentarismo, levam ao ganho de peso. O acesso fácil a comidas ricas em gordura e açúcar refinado, bem mais palatáveis, associado ao tempo prolongado na frente de uma tela de TV ou computador, talvez secundários, em partes, a insegurança das ruas, leva a um quadro de ganho de peso e DM2. Os países desenvolvidos, pelo maior poder aquisitivo da população, consomem mais fast-food, levando aos maiores índices de obesidade e DM2. O DM2 corresponde a 90% dos casos de diabetes.
A Praça – O aumento dos casos do diabetes tipo está associado a fatores de risco bem conhecidos, como sedentarismo, alimentação desregrada e falta de atividade física. As pessoas parecem ter banalizado a doença?
Dr. Rogério – Em parte. Os países desenvolvidos, pelo maior poder aquisitivo da população, consomem mais fast-food, levando aos maiores índices de obesidade e DM2, que corresponde a 90% dos casos de diabetes.
A Praça – O diabetes mellitus é outro tipo da doença?
Dr. Rogério – DM é abreviação de diabetes mellitus – mellitus do latim ‘doce como mel’.
A Praça- Quais são os maiores riscos do diabetes gestacional, para a mãe e o bebê? Quais as causas deste tipo de diabetes?
Dr. Rogério – O DM-2 pode passar despercebido pelo paciente e médico assistente, por muitos anos – condição denominada pré-diabetes, que tem as mesmas chances de complicações crônicas que o DM2. O DM2 por ser uma doença, muitas vezes, assintomática ou que produz escassos sintomas-sinais, pode ser negligenciado por anos pelos pacientes que alegam: “não sinto nada”. Os níveis elevados de glicose no sangue podem levar a sérias complicações visuais, renais, amputações de membros inferiores, doenças cardíacas e cerebrovasculares. Mostrar ao paciente que ele é parte fundamental do tratamento é de suma importância a educação alimentar e a prática regular de exercícios físicos, em alguns casos, podem ser os únicos remédios alguns estudos mostram que um bom treino de força, sob supervisão adequada, pode melhorar o controle glicêmico de forma tão eficaz quanto uma picada de insulina.
A Praça – É comum se deparar com casos de pacientes, que mesmo sendo diagnosticado com diabetes, continuam desrespeitando regras alimentares e outros hábitos, para uma convivência harmônica com a doença?
Dr. Rogério – Nas fases iniciais da doença, em especial do DM2, pode haver escassez de sintomas e sinais clínicos e a doença é assim pouco valorizada. A instituição de hábitos saudáveis de vida, quase sempre, é bem complicada, em especial entre idosos que já têm suas rotinas alimentares e são resistentes à prática de exercícios físicos. Na minha experiência, os exercícios físicos só são bem aceitos após surgirem os benefícios, isso comumente ocorre depois das três primeiras semanas de práticas regulares.
A Praça – Apesar de ser uma doença crônica que não tem cura, é possível conviver de modo saudável com ela?
Dr. Rogério – Sim, tenho pacientes que são exemplos de vida. Vivem bem controlados, metabolicamente falando. Já tive pacientes que saíram dos remédios e hoje são atletas recreacionais, com exames laboratoriais normais.
Perfil
Rogério Couras é médico endocrinologista, com graduação e residência em clínica médica pela UFPB – Universidade Federal da Paraíba. Possui residência em Endocrinologia-Metaboligia pela UFBA – Universidade Federal da Bahia. É professor de Medicina da Idomed-Iguatu.
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