José Roberto Filho
Acadêmico de Direito da FASC-Iguatu
A democracia é um espetáculo. Das elegantes frases celebracionistas nos dias de processo eleitoral até as convidativas paisagens da burocracia institucional espalhadas pelo Brasil, a épica e apaixonante novela sobre nossa formação como sociedade democrática ultrapassa os limites da confusão entre o histórico e o ilusório. Afinal de contas, a partir de que ponto o romance se torna uma tragédia grega inevitável?
No momento em que ligamos nossas televisões, celulares, rádios (se você ainda é um adepto do querido rádio) ou buscamos outras fontes de informação verdadeiramente sérias, percebe-se a presença de um fenômeno global de perigo extremo a convivência pacífica, harmônica e coletiva entre nós. Claro, não estou falando da tentativa de popularização da “Calça Skinny”, mas da guinada global ao autoritarismo e a falência das instituições supostamente zeladoras da liberdade, igualdade e justiça. Cito com destaque esses três princípios fundamentais, pois nossa Constituição Federal, assim como boa parte das democracias ocidentais, se baseia ideologicamente nos ideais propostos pelo “Iluminismo”, que por sua vez é associado imediatamente à Revolução Francesa. Uma longa história, dotada de beleza inigualável. Porém, apesar de todo esse desfile, a estrutura das passarelas institucionais as quais tal modelo de ideologia percorre não poderia estar mais precária e abalada. De fato, com toda a brutal estupidez a qual fomos forçados a conviver nos últimos seis anos não poderia ser diferente, mas é necessário e urgente utilizarmos do senso crítico para pôr em prova prática o seguinte questionamento: será possível que a nossa jovem democracia está no caminho correto? E se não, quando erramos?
A resposta é muito simples: se estivéssemos na direção certa, não estaríamos discutindo sobre isso. A questão a ser entendida por nós, o povo, é que a democracia não está restrita ao voto popular, soberano e ao depois disso. Esse é o senso comum determinado por aqueles que estão à frente das estruturas de poder, pois fica muito mais fácil deter o poder nas mãos apenas de uma minoria que não convive com as realidades de nossos pares e até mesmo as rejeitam quando não se dá a oportunidade para que a maioria conheça seu potencial de tomar as decisões.
Liberdade, Igualdade e Justiça são realmente conceitos de entendimento claro em nossa democracia? Existe Liberdade, Igualdade e Justiça em uma nação onde se coloca na cadeia uma mãe desesperada que para se alimentar e alimentar seus filhos furtou um miojo e alguns pacotinhos de suco em pó? Existe Liberdade, Igualdade e Justiça em uma nação onde todos os dias os trabalhadores perdem seus direitos e sua própria humanidade, pois um bando de parasitas não sabe a hora de parar de beber o sangue e suor dos oprimidos? Existe Liberdade, Igualdade e Justiça em uma nação em que os hospitais públicos são sucateados de propósito? Existe Liberdade, Igualdade e Justiça em uma nação onde uma bala de fuzil atinge a cabeça de uma garotinha de 5 anos de idade e as instituições de segurança pública acham isso completamente normal?
A democracia não pode ser isso. A democracia precisa antes de tudo ser entendida como um bem atribuído a nós, o povo. A democracia começa quando se dá a oportunidade de cura a todos os enfermos, quando se dá a oportunidade de aprendizado e educação a todos aqueles que necessitam, quando se dá aos famintos condições materiais dignas de existência. Não existe exercício democrático para quem tem fome, para o desempregado ou para o marginalizado. O pão, a paz e a terra para todos devem ser fundamentais na construção de uma sociedade onde a democracia pretende prevalecer. É um caminho duro e até mesmo infernal, mas atravessar o inferno buscando sair dele com certeza é melhor que permanecer queimando. Venceremos, no final das contas.
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