‘‘Chame de misantropia ou como quiser/Mas você não me engana/Não perde quem desconfia/ Culpa da nossa tão odiosa natureza humana/Se todo mundo fosse embora/E só eu ficasse aqui/Eu teria nessa hora/Um bom motivo pra sorrir/Se tudo desaparecesse/E não ficasse mais ninguém/Somente num dia desses/Eu passaria muito bem.’’ – Matanza
Apesar de engraçado o trecho letra acima, da extinta banda carioca Matanza, ele reflete bem o cansaço que nós nutrimos uns dos outros e da sociedade de um modo geral. Grosso modo, estamos cada vez mais confortáveis na nossa individualidade; fugimos cada vez mais das convenções sociais, das multidões, das relações interpessoais.
Ser sociável tornou-se uma tarefa praticamente impossível nos tempos atuais. Estamos rodeados de patéticos patrulheiros do politicamente correto, de intragáveis e igualmente patéticos militantes e afins. Não convêm nutrir sociabilidade com quem tem semelhantes mentalidades, amigo leitor. A solidão por opção é um agradável refúgio.
Os chatos do politicamente correto são como uma nuvem cinzenta que paira sobre qualquer conversa ou interação social, prontos para descarregar um dilúvio de regras e restrições linguísticas. Eles se apresentam como os guardiões da sensibilidade, mas muitas vezes acabam se perdendo no labirinto das palavras, sem perceber que sua rigidez pode sufocar a própria liberdade que defendem.
Esses indivíduos transformam qualquer troca de ideias em um campo minado de termos proibidos e expressões vetadas. Para eles, qualquer desvio das normas estabelecidas pode ser visto como uma agressão, uma falta de respeito ou até mesmo um crime. É como se cada palavra precisasse ser meticulosamente escolhida e pesada antes de ser proferida, sob o risco de desencadear uma reação inflamada.
O problema não está na intenção de promover o respeito e a inclusão, mas na forma como essa ‘‘boa intenção’’ é executada. Os chatos do politicamente correto sempre perdem de vista o contexto, a intenção genuína por trás das palavras ou até mesmo o bom humor que pode existir em certas situações. Tornam-se juízes implacáveis do discurso alheio, sem espaço para nuance ou compreensão da diversidade de perspectivas.
Ao invés de facilitar um ambiente de diálogo aberto e respeitoso, esses indivíduos podem criar um clima de tensão e desconforto, onde as pessoas se sentem mais preocupadas em evitar ‘‘gafes’’ do que em realmente se engajar em trocas significativas. Isso não apenas limita a expressão individual, mas também pode impedir o progresso em discussões importantes sobre questões sociais, políticas e culturais.
O politicamente correto se transforma em um conjunto inflexível de regras e tabus, que pode acabar alienando e marginalizando aqueles que não se encaixam no molde estabelecido. Portanto, lidar com os chatos do politicamente correto requer equilíbrio: é preciso reconhecer a importância de respeitar as diferenças e evitar ofensas gratuitas, ao mesmo tempo em que se preserva a liberdade de expressão e o espaço para o debate aberto e honesto. Afinal, a verdadeira inclusão não se impõe por meio da censura, mas sim através do entendimento mútuo e da empatia genuína.
Cauby Fernandes é contista, cronista, desenhista e acadêmico de História
0 comentários