A Praça – Qual tem sido o papel da Vigilância Sanitária, em meio a esta crise do novo coronavírus?
Samuel – A Secretaria da Saúde do Município tem feito incomensurável esforço para conter o avanço da Covid-19 através de duas grandes frentes: a Vigilância Epidemiológica, que notifica e monitora os casos, criando, assim, um banco de dados os quais possibilitam que estratégias de contenção sejam traçadas; e a Vigilância Sanitária, que tem desenvolvido não apenas o trabalho de fiscalização para que os Decretos Municipais e Estaduais sejam cumpridos, como também, tem realizado atividades educativas (sobre isolamento e distanciamento social, higienização e desinfecção das mãos, a importância do uso e a manipulação correta da máscara) junto à população e aos estabelecimentos comerciais e industriais. Entendemos, pois, que essa é a principal ação de vigilância sanitária, já que somente promovendo a conscientização das pessoas é que a população estará com riscos reduzidos ou eliminados de contrair essa doença respiratória. Não adianta distribuição de máscaras e de desinfetantes para as mãos e para os ambientes, se não nos preocuparmos em instruir os usuários. Somam-se a estas ações, o apoio, a união e o trabalho incansável de todas as Secretarias do Poder Executivo. E eu não poderia deixar de citar aqui a nossa articulação não apenas com os diversos setores da gestão, como o DEMUTRAN e a Guarda Civil Municipal, orientados pelo austero Sr. secretário Antônio Filho, mas também com outros órgãos da sociedade: o Ministério Público, tendo à frente para essa missão conosco a Exma. Promotora de Justiça, a Dra. Helga Barreto, que tem apoiado e acompanhado de perto nossos trabalhos; a Polícia Civil do Estado na pessoa do Exmo. Dr. Marcos Sandro, muito atencioso; o 10º Batalhão da Polícia Militar, inclusive o RAIO, sob o comando do solícito Coronel Sobreira; O Corpo de Bombeiros Militar tendo à frente o Tenente-Coronel Nijair Araújo; a imprensa como um todo; a sociedade civil organizada; e ainda, o imprescindível apoio técnico da Vigilância Sanitária do Estado aqui representada pela Dra. Maria José da Silva, também advogada.
A Praça – Os decretos editados pelo governador do Estado e o prefeito de Iguatu tornaram obrigatório o distanciamento social colocando as pessoas em ‘quarentena’. O senhor consegue perceber se isso ocorre, de fato, na prática? As pessoas estão cumprindo rigorosamente os decretos?
Samuel – Apesar de estarmos há quase dois meses sob o Decreto Estadual que intensifica as medidas para o enfrentamento da infecção humana pelo novo coronavírus, ainda se percebe muita gente que insiste em descumprir as orientações de distanciamento adotadas e assim, evitar as aglomerações. Sabe-se que o SARS-CoV-2 (nome oficial do vírus causador da Covid-19) é de alta transmissibilidade, o qual está contido nas secreções oculares, nasais e orais. Para se ter uma ideia, no simples ato de falar uma pessoa já expele milhares de gotículas de saliva (perdigotos) nas quais existem milhões de partículas infectantes. Imaginem então numa tosse ou num espirro! Somado a isso, o novo coronavírus continua com seu alto potencial de infectividade mesmo após ser lançado sobre superfícies dos mais diferentes materiais. Em um estudo realizado na Universidade da Califórnia, EUA, os pesquisadores constataram que em uma superfície de aço inoxidável, por exemplo, o vírus pode permanecer ativo por até 3 (três) dias! Daí, quero destacar a importância do grandioso trabalho de desinfecção que a Prefeitura vem realizando em diversos locais de grande fluxo de pessoas, além de bancos de praças, manetas e corrimões. Os túneis de oxi-sanitização recentemente instalados (um no Hospital Regional, um na UPA e outro no Centro) também são de relevante valor para desativar o agente etiológico nas roupas dos transeuntes. Portanto, em nossos trabalhos de afastamento entre as pessoas em filas de bancos ou de fiscalização da quantidade de clientes que podem estar presentes em um determinado estabelecimento, estamos sempre anunciando que basta alguém infectado sem máscara dar um espirro para contagiar, certa e principalmente, aqueles que estão mais próximos do enfermo ou do portador assintomático. Infelizmente, muitos ainda teimam em participar de comemorações, cervejadas e até bares em finais de semana nas chácaras do município. A gente adverte que os responsáveis e proprietários podem ser conduzidos para a Delegacia, caso seja constatada a aglomeração. Ora, quanto mais gente, maior a probabilidade de estar presente algum portador do vírus que será repassado para os demais participantes do evento.
A Praça – O que é mais difícil fiscalizar: os estabelecimentos comerciais para o cumprimento das medidas ou as pessoas, individualmente, por causa do uso obrigatório da máscara?
Samuel – Quando numa manhã de domingo recebi uma ligação do notável oftalmologista, o Dr. Ariosto Bezerra Vale, para tratarmos acerca da distribuição e do uso desses equipamentos de proteção individual (EPI), eu sabia que estávamos prestes a começarmos um longo trabalho de conscientização da importância de colocar a máscara. Essa peça tão importante funciona como uma barreira que ampara em grande parte a emissão do microrganismo. Por isso, aproveito e peço aqui que não permitam que pessoas falem perto de você sem estarem usando máscara. Logo, esse mesmo médico me disponibilizou um artigo científico belíssimo acerca da queda da transmissibilidade da doença entre indivíduos de uma determinada população na qual cada membro fazia uso desse EPI. Fantástico! Mais uma vez, a Prefeitura precisou criar um programa que incentivasse a produção e a distribuição de máscaras para os mais carentes. Não podíamos aplicar multas sem que antes a Vigilância Sanitária conversasse com cada beneficiado pelo material sobre a necessidade do uso da máscara. Na minha gestão sempre priorizei o diálogo e o respeito pela liberdade individual. Educar para não punir. Porém se a liberdade individual insiste em ferir os interesses da coletividade, passamos a fazer uso do nosso poder de polícia. Isso se aplica e é previsto por Lei para qualquer estabelecimento sujeito à inspeção da Vigilância Sanitária ou a qualquer comércio ou indústria determinados pelos Decretos. A abordagem individual, portanto, é bem mais difícil que a fiscalização a uma empresa. Acreditamos que uma boa conversa sempre será o melhor caminho para persuadir o indivíduo.
A Praça – As medidas adotadas para o fechamento do Centro e evitar a circulação de pessoas, consequentemente a contaminação pelo vírus deram certo, mas nos bairros a preocupação é muito grande, onde praticamente ninguém cumpre nada. A gestão já tem um plano para agir nos bairros periféricos e fazer cumprir o distanciamento?
Samuel – O setor de Comunicação da Prefeitura tem transitado com carros equipados com alto-falantes alertando as pessoas em diversos bairros, sítios e distritos. A Vigilância Sanitária tem chegado aos mais variados locais do nosso município. Durante um trabalho de inspeção, por exemplo, concomitantemente, já aplicamos uma atividade educativa que pode ser uma simples orientação para o proprietário, funcionários e clientes, mas que fará toda a diferença para que os riscos sejam minimizados ou repetidos. Percebemos pessoas que têm bom entendimento de situações de risco, como os profissionais que têm uma graduação, às vezes, serem relapsos. Avaliem então as pessoas que têm baixa escolaridade e que ainda vivem em ambientes hostis onde há falta de recursos básicos para que se tenha uma digna condição de vida. Então, é com esforço e paciência que nossos inspetores, num trabalho de corpo a corpo, têm lutado diuturnamente a fim de conscientizar a população da importância do distanciamento social e do isolamento e da obrigatoriedade do uso da máscara que, lamentavelmente, ainda é ignorada por muitos.
A Praça – O que pode acontecer com quem descumprir as determinações dos decretos em relação ao isolamento? E quanto aos estabelecimentos comerciais?
Samuel – Aqui preciso introduzir dois conceitos: o de isolamento e o de distanciamento social. O isolamento social é uma medida que visa separar quem estiver com sintomas respiratórios, suspeitos ou que tenha testado positivo para o novo coronavírus das pessoas não doentes mantendo essas pessoas em casa ou em ambiente hospitalar o que deve durar 14 dias. Segundo o artigo 268 do Código Penal, a pena para quem “infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa” é de detenção e multa. Já o distanciamento social é a diminuição da interação entre as pessoas de uma comunidade por meio do fechamento de instituições, estabelecimentos, cancelamento de eventos e pausa de serviços considerados não essenciais para evitar aglomerações. O distanciamento está contemplado nesses referidos Decretos e o seu descumprimento pode levar os envolvidos à Delegacia de Polícia Civil. Ainda que não seja presa, esta pessoa terá, se condenada, todos os reflexos de uma condenação, como a perda da primariedade. Em relação a estabelecimentos comerciais que não cumpram com decretos em relação a equipamentos de proteção individual aos seus funcionários ou promovendo aglomerações, o estabelecimento poderá sofrer multas (sanções administrativas) além da responsabilidade criminal ao gestor do mesmo.
A Praça – Como o senhor vê a evolução do vírus em nível de município? Estamos num patamar confortável e de controle, ou ainda precisamos avançar na prevenção para conseguirmos o achatamento da curva?
Samuel – Os primeiros casos notificados de Covid-19 em Iguatu apareceram um pouco depois dos casos registrados em Fortaleza. Ou seja, estamos “atrasados” em relação à nossa capital cearense, que no momento, parece estar chegando ao pico da curva. Nesse sentido, infelizmente, aqui, ainda não chegamos ao nosso ápice de número de casos dessa nova virose. Há estudos e há cientistas que sugerem que essa enfermidade nos atormentará por um tempo bem considerável, talvez até dezembro, ou que mesmo ainda a doença do novo coronavírus se tornará endêmica, como a AIDS. Por tudo isso, não podemos baixar a guarda. À medida que o tempo passa, todos vamos ficando melhor informados e por esse motivo, a tolerância para os estabelecimentos também vai ficando mais estreita. O prognóstico não é confortável, se levarmos em conta que ainda estamos longe de estendermos e otimizarmos todas as medidas profiláticas que devem ser adotadas e incorporadas no cotidiano por cada cidadão iguatuense.
A Praça – O vírus tem se revelado um inimigo muito poderoso, uma vez que ainda não há cura, há pouco conhecimento científico e biológico sobre ele e o sistema público de saúde está entrando em colapso. Qual a melhor coisa a ser feita para evitar uma tragédia ainda maior?
Samuel – Nunca se tem produzido e publicado tantos artigos científicos em tão pouco tempo com relação a um mesmo tema. Os estudos já conseguiram esclarecer muitas coisas com relação aos mecanismos patológicos dessa doença. Mas ainda não é o suficiente. Parece que ainda demora a acharmos uma droga mais específica contra o SARS-CoV-2. Além do mais, apesar de haver cerca de 90 equipes que trabalham em busca de uma vacina, das quais 6 já partiram para os testes em humanos, não se sabe, por exemplo, quais serão as reações inesperadas ou se elas funcionarão com diferentes tipos de populações ou entre diferentes faixas etárias. E mais: obter uma vacina eficaz e aprová-la será apenas o primeiro passo. Depois, haverá o enorme desafio de produzir bilhões de doses de inoculação para distribuir às populações que precisam delas. Portanto, o melhor que podemos fazer é seguirmos as recomendações de distanciamento social, usar máscaras e higienizar e desinfectar nossas mãos e utensílios constantemente. Tudo isso deve ser praticado como um hábito que durará, provavelmente, por um bom tempo. Ou seja, muitos ainda irão contrair o vírus, mas o que não pode acontecer é todos contraírem a Covid-19 ao mesmo tempo, pois não há leitos hospitalares suficientes para todos em um mesmo espaço de tempo; nem aqui e nem em cidade nenhuma do mundo, há estrutura para esse tipo de situação que pode vir a acontecer e que nos impõe bastante medo.
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