A despedida não foi como se planejava, porque quando se vive o que é bom nunca se pensa nas despedidas.
O prazer vem sempre com um gosto de eternidade e isso conquista nossas almas frágeis.
Mas deixando toda profundidade de lado (sim, concordo com o poeta que eu queria mesmo era estar do seu lado), eu não esperava essa despedida assim, por isso a falta ficou parecendo um fantasma me olhando no espelho todos os dias.
A falta vira uma companhia silenciosa e constrangedora, um peso no caminhar, um incômodo na vista.
Se a solidão é fera, se a solidão devora, a falta é uma quimera, para quem sabe a força da dor que a falta faz.
Mas a falta também, se é madrasta, pode também ser professora, e dia desses me ensinou uma alegria inesperada, dessas sublimes, dessas que nos faz mergulhar como no voo sobre um penhasco.
A falta sempre usa suas armas, mas às vezes talvez a divina providência, talvez a compreensão, como dissesse algum filósofo, a paz interior, como dissesse algum monge, as armas que a falta usa para nos ferir trazem de volta as cores da alegria perdida, como um paraíso reconquistado.
Porque em um desses dias sofridos, de passar o dia gemendo e chorando nesse vale de lágrimas, bodejando contra a vida, esbarro com seu cheiro, um dos seus cheiros, muito mais que qualquer perfume, que me tomou de assalto enquanto eu juntava o que você esqueceu por aqui.
Os cheiros, quando abrem o guarda-roupas da memória, também são uma biblioteca de emoções, porque nunca vêm sozinhos.
Preso naquele cheiro, porque não era perfume, era cheiro, fui arrebatado como talvez sejam os profetas, para alguma coisa que certamente não consigo exprimir, porque é uma linguagem que vai muito além das palavras, mas que qualquer pessoa que sabe o que é sentir também sabe o que é.
A alegria dos cegos em uma catedral antiga, talvez, foi como me senti ali, queimando na pele as cores do sol atravessando as chagas de Cristo desenhadas em vitrais coloridos.
Porque ali existe, (- a voz de um anjo sussurrou no meu ouvido -) existe a glória do encontro com o sublime do coração em chamas, consumido pelo amor, que mesmo morto, sabe dos milagres de ser ressuscitado e morrer perdido nas gavetas mais uma vez, até outro dia, até outra sorte.
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