Régis Luiz Jordão de Alcântara, defensor público
A realidade do consumidor mudou repentinamente frente a disseminação do Covid-19, quer nos grandes centros urbanos, quer nos rincões do Brasil. A ameaça é provável, ainda que, à luz da evidência, não haja a confirmação de que um próximo esteja contaminado. O “se ouviu dizer” ressoa nos ouvidos de todos. Alimenta a desconfiança e reforça o dever pessoal e coletivo de confinamento. Traz, a reboque, a necessidade de aquisição de produtos essenciais a mantença durante o período de isolamento, cujo caminho aos supermercados, embora seja rotineiro, torne-se inevitável.
Há vários relatos, facilmente acessíveis via web, de aumentos repentinos de diversos produtos, especialmente os Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), fundamentais para a proteção contra o contágio. Exemplo disso é a alta dos preços das máscaras. A modelo N95, mais indicada entre os especialistas, custava, em valores aproximados, em período anterior ao surto, míseros R$ 3,00 (três reais) a unidade, acessível grande maioria da população; aumentou para R$ 15,00 (quinze reais) após a notificação do primeiro caso no Ceará, em meados de março; nova alta com a disseminação da doença, passando a custar R$ 30,00 (trinta reais), e disparou, recentemente, para expressivos R$ 95,00 (noventa em cinco reais), preço inacessível para grande maioria da população.
Comparando os extremos, houve uma majoração de 31 vezes o valor inicial, em pouco mais de 30 (trinta) dias. E, de logo, questiona-se: essa alta é legal? Os fornecedores e comerciantes podem elevar os preços livremente? Não haveria um impedimento legal que limitasse a alta em períodos de instabilidade econômico-social?
A liberdade da oferta, em regra, é controlada pela máxima da mão invisível de Adam Smith, isto é, o preço dos produtos é balizado pela lei da oferta e procura. Quanto mais há, menos se vale e vice-versa. Porém, em momentos de crise, a regulação do preço pelo mercado abriria o flanco para o abuso do direito de impor valor a um produto ou serviço, limitando o acesso deles a uma minoria que dispõe de fôlego financeiro para suportá-lo.
A Lei Federal n° 1.521, de 26 de dezembro de 1951, prevê como crime a prática do aumento abusivo de preço por mera cupidez, prevendo o aumento da pena em virtude de seu cometimento em época de grave crime econômica, competindo ao Ministério Público o oferecimento da ação penal, e sendo facultado a qualquer do povo lhe noticiar a ocorrência do delito.
Para além de um crime, a alta de preços em momentos de pandemia evidencia idiossincrasias sociais a mercê do senso civilizatório e comunitário indispensáveis para uma convivência fraternal entre concidadãos, afinal de contas uma sociedade que demanda repetidamente o rigor da lei para alcançar a paz social, jamais gozará de maturidade bastante para resolver seus problemas pelo bom senso.
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