Nunca ficamos tanto tempo em casa como agora. Nunca ficamos tanto tempo dentro de nós como agora. A casa não somente como espaço físico com muitos ou poucos, grandes ou pequenos cômodos, mas a casa como nosso interior. Haveríamos nós de ir para outro lugar que não fosse nossa casa/abrigo interior?
A casa nos protege e nos integra. A ela retornamos meio perdidos como quem volta ao colo de mãe entre sorrisos e lágrimas. Porque na casa, assim como no colo de mãe, há sempre bons afagos que nos levam ao sossego. Casa e colo como espaço amado, poético e aconchegante.
Ficar em casa por muito tempo parece despertar fortes emoções. As fotografias, os quadros, os móveis e outros objetos acionam a memória. E aí vem o passado na carruagem do tempo para nos fazer lembrar as vivências de uma juventude remota e a valorização de nossa história. Há na casa espaços felizes, libertadores, oníricos e sagrados.
A casa é nosso mundo, nosso corpo, nosso seio materno. Ficar em casa é como ficar dentro de nós. Então, podemos experimentar nossas memórias, sonhos e desejos. Portas e janelas olham para o mundo lá fora. O telhado nos protege. A sala é o espaço que pulsa forte. Nos quartos está o descanso, na cozinha a prosperidade e no banheiro as impurezas. Tudo na casa revela um pouco de quem somos e expressa nosso interior.
Dentro de nossa casa, sentimo-nos protegidos, pois nem o ladrar do cão nos inquieta. A casa é intimidade que se ritualiza nos horários das refeições, dos cafés, das conversas, da oração. Em casa o tempo sossega e até cochila. Tudo fica mais liberto, mais agradável, podemos ainda, se assim for nosso desejo, nos livrar das representações.
Por esse tempo de confinamento, num cantinho de minha casa, meus olhos espiaram melhor duas coisas: o correr da lagartixa pela sala e o passarinho na minha janela. Por meio dos dois bichinhos, pensei na complexidade e na simplicidade da vida ao mesmo tempo. Todos os dias eles estão lá como se quisessem me desejar bom dia. Achei isso tão gracioso. Sou fácil de me emocionar.
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