Nenhum filósofo, na minha opinião, foi tão coeso e lúcido quanto Arthur Schopenhauer (filósofo alemão do século XIX (1788-1860) quando o assunto é a tal felicidade. E não, não pretendo aprofundar aqui a sua filosofia – até mesmo pelo fato de que li muito pouco sobre… mas lembro-me de ter esquentado muito a cabeça ao ler “As dores do mundo”.
Schopenhauer defende que o propósito da vida consiste na busca da felicidade, mas o “verdadeiro objetivo” é a infelicidade – que é imposta pelo “destino” e conduz à auto supressão da Vontade. Dito isto, o fardo do existir nos cai por sobre os ombros. Vivemos, portanto, se não na completa ilusão ou esquizofrenia, mas na completa acidez de perceber que a vida é um ir e vir de sucessivos tropeços, desastres. Viver é dor. Só os lunáticos parecem ser felizes, pois desconhecem o mundo real; sua crueza não os afeta, estão completamente destituídos da realidade (eles sim são felizes!).
Acaso duvidas, caro leitor? Achas a minha concordância um exagero? Pois bem, assim sendo, devo prosseguir, mas para tanto, o filósofo alemão testificará por mim o fato de a minha concordância não advir de qualquer exagero ou leitura enviesada da obra desse grande homem.
Em “O mundo como vontade e como representação”, Schopenhauer nos joga a seguinte bomba de aforismo: “A felicidade não passa de um sonho, e a dor é real… Há oitenta anos que o sinto. Quanto a isso, não posso fazer outra coisa senão me resignar, e dizer que as moscas nasceram para serem comidas pelas aranhas e os homens para serem devorados pelo pesar.”
Pelo que vemos, o filósofo nos coloca na condição inalterável da condenação ao degredo, do inexorável caminho enfadonho do existir (não a morte, mas o trajeto até ela é o que o incomoda… o que nos incomoda, aliás). E se o amigo pensa que isso é papo de quem não ama, de revoltado que busca ou anseia um amor verdadeiro, esqueça tal concepção. Também não é o amor por alguém (ou algo) que salva o homem. Queres provas filosóficas para retificação? Certo. Vamos a ela, que pode ser encontrada na obra “A arte de insultar.”
“Trata-se de uma ilusão voluptuosa aquela que faz o homem crer que encontrará prazer maior nos braços de uma mulher, cuja beleza corresponde aos seus anseios, do que nos braços de outra, ou até mesmo aquela que o convence firmemente — se endereçada exclusivamente a um único indivíduo — de que possuir tal mulher lhe proporcionará uma felicidade efusiva.”
A felicidade em Schopenhauer lembra um pouco o amor fati de Nietzsche: poder-se-ia dizer que a felicidade schopenhauriana seria também uma espécie de amor pelo destino, afinal, há uma redenção ao perceber que a tristeza e a dor é o que é perene na vida homem, não a felicidade, pois esta nos é rara. Encontramos conforto e maior valoração quando reconhecemos a raridade dos parcos momentos felizes.
Portanto, não demos assim tanto valor à felicidade… ela nos é completamente inútil. Somente a dor e o sofrimento transcende os espíritos livres… livres até da fugaz felicidade… Porém, quando esta lhe sorrir, saiba aproveitar, pois logo ela se dissipa.
Cauby Fernandes é contista, cronista, desenhista e acadêmico de História
0 comentários