Tenho saudade de um comercial onde brasileiros reclamavam das mazelas nacionais. Todos os atores que contracenavam, eufóricos, manifestavam inquestionável descontentamento com o país, mas nenhum permitiu que outro ator, travestido de turista argentino, tivesse igual comportamento, na condição de visitante. Bastou que lançassem fulminante olhar para que o gringo percebesse a mensagem:
“Somos brasileiros e podemos lavar a roupa suja entre nós. Você, não!”
E isso é uma verdade! Dentro de casa, onde temos problemas diários, falar verdades, questionar, reclamar, espernear é um direito… Mas não admitimos que estranhos “metam a colher”!
Ainda de modo análogo, os grandes problemas familiares surgem quando pequenos detalhes deixam de ser corrigidos oportunamente; quando admitimos que a louça não seja lavada, que as roupas sejam jogadas ao chão de qualquer forma; quando a grosseria substitui o diálogo respeitoso… Quando tijolinhos são colocados, dia após dia, com a anuência de todos. De repente, surgem barreiras imensas e a casa desmorona dentro de si mesma, sem muitas interferências externas que surgem, apenas a posteriori, decorrentes dos vazios e dos espaços que criamos pelas razões as mais múltiplas possíveis. Sem que percebamos, destruímos nossas relações familiares, gradualmente.
As famílias formam as comunidades, que se agrupam em estruturas maiores, que culminam com a formação do Estado. Portanto, famílias silenciosas, onde reina o silêncio, posterior ao grito, criam uma sociedade barulhenta, fragilizada, cheia de medos, mitos e subterfúgios.
Urge que tenhamos mais vontade de ficarmos à vontade dentro de nós. Precisamos conhecer e reconhecer a nossa morada, o habitat das nossas essências humanas; o nosso lar. Maus filhos, em se tratando de famílias, serão péssimos filhos da Pátria. E hoje o que temos, em vários níveis sociais, é o acúmulo de brasileiros e brasileiras que se despem em praças públicas, acreditando fazerem sentido todas as desprezíveis manifestações de protestos vazios e inúteis que ganham força na razão direta com que se despiram dos bons valores – da cidadania, do respeito, da história, da moralidade, do culto aos Símbolos Nacionais. Temos brasileiros que conhecem minúcias das telenovelas, mas ignoram completamente o porquê de sermos Brasil: o que temos, o que somos, por que fomos vilipendiados por tantos séculos…
Precisamos reaprender o valor da nossa Pátria Amada. Devemos sentir orgulho do que somos, apesar de todas as dificuldades e distorções que se nos são impostas, alheias às nossas vontades. É necessário que amemos as nossas cores e nos revistamos de mais brasilidade – não apenas diante de estrangeiros, quando nos xingam, mas entre nós.
A propaganda a que me referi, inicialmente, era sobre uma marca de sandália… Mas a lição que tirei à época e que me veio novamente à baila, é a de que já apanhamos demais, já fomos humilhados sobremodo por nós mesmos e por outros povos e nações. Passamos do ponto, perdemos vários bondes, deixamos várias oportunidades para trás. Mesmo assim, continuamos a caminhada, com os chinelos desgastados, formando novas famílias, construindo e acreditando em nossa nação.
Não estaria na hora de nos revestirmos de mais brasilidade, de fortalecermos a nossa unidade verde e amarela e mostrarmos para os demais membros da nossa casa que somos capazes de nos unir, vestindo-nos e não arrancando nossas vestes, a troco de nada, sem que precisemos de puxões de orelhas nem de zombarias externas?
Não aguentamos mais apanhar de novas mãos que usam as mesmas e velhas pantufas.
0 comentários