‘‘É este o problema com a bebida, pensei, enquanto me servia dum copo. Se acontece algo de mau, bebe-se para esquecer; se acontece algo de bom, bebe-se para celebrar, e se nada acontece, bebe-se para que aconteça qualquer coisa.’’ – C. Bukowski
Era uma noite chuvosa, com o cheiro de cigarros e cerveja impregnando o ar daquela pequena taberna. Eu estava sentado no balcão, desfrutando de um copo de cerveja solitário, quando meus olhos encontraram um homem peculiar sentado no canto mais escuro do bar.
Ele tinha uma aura de mistério ao seu redor, vestindo um casaco de couro surrado e com um chapéu enfiado na cabeça. Sua barba grisalha estava desalinhada, e ele mantinha um olhar distante, como se estivesse observando o mundo através de lentes cansadas. Era Charles Bukowski.
Sim, amigo leitor, Charles Bukowski, ele mesmo, o escritor e poeta americano conhecido por sua poesia e prosa marcadas pela honestidade brutal, pelos temas sombrios e pela abordagem realista da vida marginalizada. Ele nasceu, salvo engano, em 16 de agosto de 1920, em Andernach, na Alemanha, mas mudou-se para os Estados Unidos com sua família quando criança. Mas enfim, voltemos ao relato.
Intrigado pela presença daquele famoso escritor renegado, decidi me aproximar. Com passos hesitantes, caminhei em sua direção. Enquanto eu me aproximava, ele ergueu os olhos e me encarou com um sorriso sutil, como se soubesse que eu estava prestes a me aventurar em seu mundo particular.
Sem pedir permissão, sentei-me na cadeira ao seu lado. Pedi ao garçom uma cerveja e, com um aceno de cabeça, Bukowski fez o mesmo. Enquanto sorvíamos nossas bebidas, o silêncio preenchia o ar, mas a energia compartilhada era palpável.
Depois de um momento, Bukowski quebrou o silêncio com sua voz rouca e sussurrante. Ele começou a falar sobre sua vida, suas experiências, suas batalhas com os demônios internos e suas paixões incontroláveis. Cada palavra que saía de sua boca era crua e honesta, como se ele estivesse despejando sua alma em cada frase.
Eu ouvia atentamente, envolvido em suas histórias cheias de tristeza e melancolia, mas também de esperança e humanidade. Ele falava sobre o amor e o desespero, sobre a luta para encontrar beleza na vida cotidiana, sobre a dor de existir em um mundo que muitas vezes parecia indiferente.
Enquanto Bukowski compartilhava seus pensamentos mais profundos, percebi que ele não estava apenas me contando sua história, mas estava me ensinando sobre a natureza humana, sobre a resiliência e a capacidade de encontrar beleza na decadência.
Passamos horas naquele canto sombrio da taberna, mergulhados em conversas que pareciam transcender o tempo e o espaço. À medida que a noite avançava, as palavras de Bukowski ecoavam em minha mente e em meu coração, deixando uma marca indelével.
Quando finalmente nos despedimos, o bar já estava quase vazio. Ele se levantou lentamente, apertou minha mão com firmeza e sussurrou: “Continue escrevendo, meu amigo. Encontre a verdade em suas palavras, mesmo que doa. Nunca deixe que o mundo o cale.”
E assim, enquanto observava Bukowski desaparecer na escuridão da noite, prometi a mim mesmo que seguiria seus conselhos. Naquela noite, naquela taberna, encontrei um mentor improvável e um amigo para a vida toda.
Cauby Fernandes é contista, cronista, desenhista e acadêmico de História
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