Sem apoio, incentivo direto da iniciativa pública e privada, é árdua a luta de quem faz arte no interior cearense. Em Iguatu não é diferente. A Companhia de Teatro Ortaet, mesmo diante de tanta luta, segue resistindo ao longo de mais de duas décadas fazendo arte, sobressaindo com mérito próprios e apoio maior do público. Sucesso de público, a peça Neci, monólogo encenado pela atriz Betânia Lopes, volta ao Cariri este final de semana.

A Casa Ninho abre as portas para receber o público hoje, sábado, 30, e amanhã, domingo, 31. “Pra gente, é um prazer voltar ao Cariri, no Crato, com Neci neste final de semana. O público de lá tem um carinho grande com a gente. Recebemos muitas mensagens das pessoas ansiosas por essa apresentação”, destacou Betânia Lopes, que antes de pegar a estrada rumo ao Cariri conversou com nossa reportagem.

Assistir até mesmo ao ensaio no Galpão Pac/Ortaet, no centro de Iguatu, é presenciar o primor, cuidados que são feitos de forma simples e autêntico o espetáculo, que tem direção da dramaturga Aldenir Martins, encenador José Filho, e o talento de Betânia Lopes, que interpreta Neci.

O cenário

Neci abre as portas de sua casa, mais precisamente sua cozinha para conversar diretamente com o público. Durante a peça, causos da vida, puxão de orelhas na sociedade homofóbica, exploração e violência contra a pessoa idosa são tons que regem a prosa enquanto Neci vai preparando um cafezinho, um bolo de ‘caco’, ali mesmo diante do público.

A palavra provoca, aquece, transgredi e conduz no corpo de Neci histórias do povo que são moídas, misturadas como ingredientes dentro de um tempo satirizado em causos, ora sexualizados, ora politizados. Esses causos da vida, vida que pode ser a de qualquer um, depois de moídos seguem seu destino, vão para o forno, são assados sem pressa no grande encontro de vidas entre anfitriã e convidados que entre um e outro dedinho de prosa sentados à mesa a degustação acontece.

A personagem

Neci, entre uma memória, um conto, histórias e causos, manifesta o desejo e a ousadia de quem quis e quer apenas viver. O que é a velhice? Como deve ser encarada? O que deve perpetuar a lembrança? O que nos faz perceber que a experiência vivida valeu mesmo a pena? Estas são algumas questões que permeiam o espetáculo que, segundo Aldenir Martins, surgiu a partir de uma pesquisa realizada por Betânia Lopes, tomando como ponto de partida Neci, senhora idosa de aproximadamente 72 anos, residente no Sítio Barroso, zona rural de Quixelô. “O espetáculo não se propõe a ser biográfico, ainda que traga relatos e acontecimentos vivenciados por dona Neci. A sua história e memória servem como pano de fundo para um diálogo com questões atuais, pertinentes ao cotidiano de toda sociedade brasileira”, declarou.

O enredo

Partindo das memórias e da história oral presentes nas narrativas coletadas junto a Neci, a dramaturgia de Aldenir Martins coloca na berlinda de forma provocativa e problematizadora mazelas que acometem nosso tempo presente, mas que são atemporais, dentre elas o racismo, homofobia, machismo, violência contra a mulher e violência contra os idosos e solidão.

A personagem conversa com a sua temporalidade presente, sem amarras, sem vergonhas e ou intimidações impostas pela modus-operandi, que coloca os idosos quase numa posição de inexistência, a estes seres excluídos da sociedade dita produtiva, é negado o amor, o sexo, a vitalidade, o empreendedorismo colocando na maioria das vezes numa posição de invisibilidade. A encanação segue outro caminho, o da vivacidade desse ser Neci em toda sua plenitude com todas as suas nuances e formas que são experiências e compartilhadas no ato de entrega da atriz e recepção do espectador.

“Levar o espetáculo para outras localidades, encontrar outros públicos é muito importante não só para o espetáculo, mas para a Cia Ortaet também, pois amplia nossa rede de afetos, parceiros ampliando alcance da nossa arte que o teatro para além dos limites de Iguatu”, relatou o encenador José Filho.

Serviço

Cia Ortaet apresenta “Neci”

Dias: 30 e 31 de julho

Horário: 19h30

Local: Casa Ninho (Rua Ratisbona 266, Centro, Crato – CE)

Ingressos: R$: 20,00 (inteira) e R$ 10,00 (meia)

Indicação: 14 anos