À exceção dos 20% de fanáticos que seguem insanamente o presidente Jair Bolsonaro, a que se somam ortodoxos de extrema-direita e a gente endinheirada para quem nada é mais importante que sua riqueza, perfazendo os 30% que ainda dão sustentação a esse governo tresloucado e fascista, todos sabem: o país está à beira do caos.
Entregues à sorte das vontades inconfessáveis da primeira-família, os brasileiros assistimos, como que impotentes, ao ódio institucionalizar-se pelos quatro cantos do território nacional. Em meio ao pandemônio, que lembra o pior da ficção da literatura e do cinema, resta-nos ler bons livros, nomeadamente aqueles que nos ajudem a compreender o destino tenebroso a que fomos condenados.
A esse propósito, acabo de ler, em versão e-Book, o oportuníssimo Contra o Ódio (Editora Âyiné, 194 págs.), da filósofa e jornalista alemã Carolin Emcke, um consistente trabalho em que se misturam ensaio crítico e reportagem capaz de apontar caminhos para a interpretação de um tempo marcado pela aversão ao diferente e ao contraditório.
Nesse sentido, embora apoiado predominantemente em exemplos extraídos dos Estados Unidos e da Europa, o livro constitui um esteio analítico bem apropriado para se tentar penetrar o universo autoritário e intolerante por que o Brasil vem sendo conduzido no atual (des)governo.
Sobre a Alemanha, por exemplo, o ensaio examina como, à luz de uma política reacionária a exemplo da nossa, é que os alemães professam o fortalecimento de um sentimento nacionalista que se contraponha à globalização, à convivência pacífica com os imigrantes, com as minorias e os grupos historicamente excluídos, como forma de construir o que a autora define como, para esses, seria a verdadeira Alemanha.
Contra o Ódio, subdivide-se em três partes: 1. Visível – Invisível; 2. Homogêneo – Natural – Puro e 3. Elogio ao Impuro. Mas é na segunda delas que o livro concentra toda a sua força, com reflexões originais acerca de temas considerados eternos, o Amor, a Esperança, a Preocupação, o Ódio e o Desprezo.
Numa percepção a um tempo simples e esclarecedora, Carolin Emcke nos faz lembrar que “O outro é fabulado como um poder supostamente perigoso ou como algo supostamente inferior; e assim os maus-tratos e o desejo de erradicação subsequente do outro não são reivindicados apenas como medidas desculpáveis, mas necessárias. O outro é aquele a quem alguém pode denunciar ou desprezar, ferir ou matar impunemente”.
Para quem, não pertencendo ao esquema perverso que impera hoje no Brasil sob diferentes máscaras, queira respaldar em chave teórica a sua interpretação do Brasil hoje, o livro de Carolin Emcke constitui uma leitura oportuna e por demais enriquecedora.
Recomendo.
Álder Teixeira é Mestre em literatura Brasileira e Doutor em Artes pela Universidade Federal de Minas Gerais
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