“O último ato é sangrento, por melhor que seja a comédia em todo o resto: no final se joga terra sobre a cabeça e é isso para sempre.” Blaise Pascal.
Recentemente completei 38 anos. Um colega de bar diria que já estou mais do que numa “idadezinha” boa de criar vergonha na cara.
Um escritor francês diz que a velhice não é a soma dos anos que a pessoa tem, e sim quantos ainda lhe restam a partir de certa idade.
Lembro-me de uma aluna que teve câncer. Ela tinha seus 16, 17 anos à época. Mas, na maioria das vezes, parecia uma mulher experiente e sábia, sem jamais se colocar como vítima das circunstâncias.
Já noutros momentos ela aparecia na sala de aula contando a sua idade: suas experiências juvenis, seus amores proibidos, suas desobediências; sem se importar com obrigações, numa ânsia brutal de sugar o máximo da vida.
O câncer não a quebrou e muito pelo contrário: deu-lhe não só um senso de urgência pela vida, mas também uma maturidade precoce. Até onde sei, ela está viva e bem.
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Há várias formas de envelhecimento. Com sorte e dinheiro, alguns evitam o quanto podem a mais explícita delas: a física. Já a maioria das pessoas, nesse sentido, é fodida ou pela genética ou pela pobreza.
Homens calvos de 23 anos tem de mostrar a identidade para que creiamos que eles têm a idade que afirmam ter.
Pessoas cuja necessidade faz com que trabalhem em ambientes escorchantes, expostas ao sol duarente horas a fio ou coisa parecida, também sentem o corpo envelhecer mais depressa. Já conversei com operários de 30 anos que pareciam ter quase o dobro da idade.
Há ainda pessoas jovens cuja mente e o corpo são tão ferrados que parecem uma farmácia ambulante. Se tivéssemos acesso apenas ao receituário delas, sem conhecê-las, diríamos que já estão ultrapassando o cabo da boa esperança.
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A nossa sociedade tem verdadeiro pavor ao envelhecimento físico, precoce ou não. Há alguns anos foi escrito um texto que gerou espécie em nossa cidade.
Era uma sátira mordaz e polêmica sobre as academias de ginástica, para usar um termo já velho.
Ainda não existia a palavra “cancelamento”, tão em voga hoje em dia, mas foi exatamente o que ocorreu: falou-se em réplica, retratação, processo, o diabo. Os ânimos estavam tão aflorados que quase houve um linchamento em praça pública.
Queriam a cabeça do autor. Eu lembro que ri muito lendo o texto. Não me entendam errado.
Eu também ficaria ofendido se o texto fosse apenas e tão somente sobre pessoas que fazem exercícios físicos, ou uma defesa extrema do sedentarismo. O problema é que não se tratava disso, afinal.
Uma leitura atenta demonstrava que o autor estava tratando, no fundo, da antiga comédia humana e sua luta vã contra o envelhecimento e à morte.
Caminhamos, querendo ou não, para o esquecimento, para o “ato final” do qual falava o filósofo cristão Blaise Pascal (1623-1662).
Filhos da finitude, somos conscientes de que nossa passagem por esta terra é efêmera, breve. Só convivemos bem com essa consciência se não nos levarmos muito a sério.
Essa zombaria à tendência humana de lutar contra o envelhecimento e à morte faz parte de toda uma tradição literária.
Não começou, portanto, por causa das academias de musculação e tampouco o primeiro faraó foi marombeiro.
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A idade é mais bem avaliada se lavarmos em conta a criação e o ambiente onde se vive. Só o que se vê por aí são meninos “velhos”, sem disposição para qualquer trabalho que exija o ato de levantar -se e soltar o celular.
Por outro lado, há homens e mulheres de 60, 70 anos que fazem trabalhos manuais como se tivessem quarenta, trinta anos ou até menos.
Nas artes marciais, por exemplo ,38 anos me torna velho; mas numa situação real, face to face, bem… Aí já é outra história.
Marcos Alexandre: Pai de Edgar, leitor, Professor de literatura e redação, cinéfilo e aspirante a escritor.
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