A Vingança de Circe
A Guerra de Troia foi vencida por trapaceiros; particularmente por um, o “herói” Ulisses. Para lutar, matar e sobretudo morrer há que ter honra. Os gregos não a tiveram; nem a Virtus que sobremaneira caracterizou os troianos, ancestrais de Roma.
Com efeito, exemplum patet, mostra o exemplo o maior dos embusteiros, Ulisses. Toda a sua trajetória mítica é marcada, tanto na Ilíada como na Odisseia, por torpes ardis. Ele vence os obstáculos não pelo verdadeiro e nobre heroísmo, mas pelo vil engodo. Por que, tal como Aquiles, não enfrentou o principal líder da venerável Troia, Heitor?
Ulisses é a raposa traiçoeira. Mas a sua vida de numerosas faltas para com a Honor encontrou uma Nêmesis terrível no final. Mas situemos os fatos da narrativa mitológica. No canto X da Odisseia encontramos a personagem Circe, uma demoníaca feiticeira totalmente nefasta que abriga em sua ilha Ulisses e seus companheiros batidos por um naufrágio. Na elegante tradução do grego feita por Odorico Mendes temos este registro: Na ilha aporto Eéia, da terrível\ Música Circe de madeixas de ouro.
Circe não merece qualquer simpatia; é a consumada femina fatalis. Transforma todos os marinheiros de Ulisses em animais e se não fosse o auxílio de Minerva também ele teria o mesmo destino. Não é esse o ponto que interessa aqui. Interessa-nos a conduta sempre falsa e enganadora de Odisseu. Ele engana e humilha a poderosa feiticeira. Supostamente apaixonam-se. Ele permanece com ela um ano e dela tem um filho, Telégono. Depois simplesmente a abandona e segue o seu rumo para Ítaca. Circe fica desconsolada e jura vingança.
Nemesis semper venit! O castigo sempre vem. Ulisses, já tendo vencido a guerra contra os troianos e tendo voltado para casa e recuperado o seu trono em sua ilha, vem a repelir um grupo de náufragos invasores. À frente deles está Telégono, que não sabe onde se encontra nem quem é o seu pai. Lutam então pai contra filho e este vem a matar o seu genitor. Os deuses promovem o reconhecimento antes de Odisseu morrer nos braços do filho. Um antigo oráculo previra ao herói que tivesse cuidado com a mão do próprio filho. Completando a sina nefasta, Telégono, o filho bastardo, assume o trono de Ítaca e se casa com a cobiçada rainha Penélope!
Triste ironia, triste destino. O homem trapaceiro que tanto lutou e demorou tanto depois para chegar a casa terminar assim, morto pelas mãos do próprio filho ilegítimo!
Professor Doutor Everton Alencar
Professor de Latim da Universidade Estadual do Ceará (UECE-FECLI)
0 comentários