Eles largaram carreira, faculdade e empresa pela cozinha

13/06/2020

Luíza, Alailson e Edinho, os três protagonistas da reportagem desta edição do A Praça, da série ‘Os pequenos negócios e os impactos da pandemia’, muito provavelmente não se conhecem, talvez nunca se viram, apesar de morarem na mesma cidade, e economicamente dependerem da mesma atividade para viver.

Situações antagônicas à parte, o que une essas personalidades neste diagrama gráfico escrito são suas histórias em comum: pessoas com um sonho na cabeça e muita disposição para empreender, que um dia, movidos pela perda do emprego, o adeus à carreira de executivo naquela empresa, ou simplesmente pela necessidade de buscar seu próprio espaço no mercado, resolveram num ‘estalo’, colocar em prática seus projetos de um pequeno negócio, acreditando, sobretudo, que é no meio da crise, que enquanto alguns choram, outros estão vendendo os lenços. Em outras palavras: é na crise que se pode enxergar as grandes oportunidades. E foi o que aconteceu com eles.

A série do A Praça sobre os impactos da pandemia na vida econômica dos cidadãos tem contado histórias de sucesso de pessoas e suas ideias brilhantes. As histórias contadas aqui não apenas mostram o talento individual, a capacidade de empreender, a viabilidade de um pequeno negócio em meio a uma crise aguda de saúde pública, mas principalmente serve para inspirar pessoas. Os protagonistas citados nas reportagens são anônimos, homens e mulheres que nunca desistiram de seus sonhos, e agora, quando se veem numa encruzilhada pandêmica, estão buscando aquele projeto guardado no fundo da gaveta, ou no mais longínquo espaço da imaginação, para colocar em prática e dizer à crise que não vão se abater.

Força, resiliência e determinação

Neste grupo estão a acadêmica de Odontologia, Luíza Kayane Guedes de Abreu, 30, idealizadora do ‘Pães da Lu’; pães caseiros recheados, pão de queijo congelado e café cremoso, o ex-promotor de vendas José Alailson Amorim Andrade, 27, autor do ‘Gula Store’, receita do cuscuz com cobertura e recheio, e os famosos dindins gourmet, e Francisco Edney Carmo Rolim, ‘Edinho’, 45, do ‘Sonho Doce’; bolos decorados para datas comemorativas, variedade de massas e salgados servidos na merenda escolar e o carro-chefe do negócio: o bolo inglês. Este último foi uma sacada do ex-funcionário de uma grande rede de supermercados, que enxergou na crise a oportunidade de trabalhar para ele mesmo.

Em cada empreendimento está presente a força, resiliência e determinação de cada empreendedor, em continuar inovando em seus negócios, que foram lançados, se adaptaram à cidade e estão ganhando o crédito do público consumidor. Para eles, a pandemia foi a oportunidade que faltava, pelo fato de trabalharem com alimentos prontos; produtos de consumo imediato. Para esses empreendedores e seus negócios, dois fatores são determinantes: o uso das redes sociais para divulgação e propagação dos produtos e os serviços de delivery. Entregar o prato fresquinho na casa do cliente está virando uma marca registrada desses pequenos negócios. Temperos caseiros, feijoada, vatapá, mungunzá, pão recheado, cuscuz com cobertura, sanduíches, batatas recheadas, bolos, pudins, doces, dindins gourmet.

Pelo sucesso que faz com a clientela, consegue gerar oportunidades de ocupação com remuneração financeira para seis pessoas, incluindo o entregador

Pães da Lu

Os pães caseiros criados por Luíza Kayane fizeram tanto sucesso que ela aproveitou o nicho e transformou num negócio promissor que só tem crescido. Pães recheados, pão de queijo congelado e café cremoso compõem o menu idealizado pela iguatuense que morou 12 anos em Brasília, mas há um ano retornou com os filhos para sua terra natal.

O ‘Pães da Lu’ começou por acaso, num belo dia em que Luíza teve a ideia de preencher uma lacuna do mercado carente do produto. Ela fez três pães caseiros, fotografou e postou num grupo de WhatsApp da família. A venda foi imediata, o sabor e textura aprovados por unanimidade. De lá para cá, não parou mais. Depois ela lançou os pães com recheio, pães de queijo congelados e o café cremoso. E tudo aconteceu quando ela tentava voltar para a faculdade. Foi quando a pandemia virou o mundo pelo avesso e fez a acadêmica mudar os planos. No caso dela, a crise estimulou o surgimento do negócio. Luíza iniciou o negócio com a amiga Monalisa, que mora com ela, depois envolveu a irmã, o sobrinho e mais duas pessoas. Pelo sucesso que faz com a clientela, consegue gerar oportunidades de ocupação com remuneração financeira para seis pessoas, incluindo o entregador. O delivery é a ponte principal entre o empreendimento e o público consumidor. Os clientes fazem os pedidos via telefone, Instagram ou Facebook e recebem no endereço.

Receita da infância

Luíza disse que para acertar no sabor diferenciado dos pães, buscou na lembrança da infância uma receita de pão caseiro de uma tia. Associado a isso, veio o talento natural que ela tem para lidar com as massas e a paixão pela culinária. Antes de fazer sucesso com os pães, Luíza já era admirada por suas habilidades em fazer tortas, doces, e salgados, sempre com aprovação e incentivo da família, para tornar seus dotes culinários uma profissão. Mas ela só descobriu isso quando a pandemia chegou e apertou o orçamento de casa. “Amo culinária, sempre gostei muito de cozinhar, muito mesmo, então um dia eu quis começar a fazer algo que ninguém fizesse”, disse.

Para trabalhar com as massas, Luíza adaptou uma ala da casa onde mora, na Av. Alberico Mendonça, no bairro Cajueiro, transformando numa cozinha especial, para dar mais privacidade e melhor ambientação para o trabalho. Ela explicou que a confecção é toda artesanal, desde o preparo da massa até a embalagem, respeitando as normas sanitárias, de higiene e saúde, com o uso de luvas, touca, avental e máscara, pela equipe.

Apesar de ainda estar na informalidade, é meta de sua idealizadora formalizar o negócio.

Gula Store

O bairro Morenão foi o local escolhido pelo ex-promotor de vendas José Alailson Amorim Andrade, 27, para instalar seu pequeno negócio, o ‘Gula Store’. Está na Rua professora Rosa Gouvêa, na lateral do colégio Ruy Barbosa. Uma cozinha de casa, onde são preparados pratos de cuscuz com recheio e cobertura, uma inovação do mercado culinário. O prato especial, totalmente adaptado da culinária regional usando como base o cuscuz de milho, vem caindo no gosto da clientela. Pode ser servido para o jantar, café-da-manhã e até no almoço. Outro diferencial também é o preço, faixa de R$ 7,00 reais por cada porção. Os dois parceiros sócios usam as redes sociais para divulgar os produtos e afirmam que foi também a pandemia do coronavírus que deu oxigênio ao negócio. “Essa crise nos ajudou a enxergar a oportunidade e permitiu a gente se reinventar, profissionalmente, tendo nosso próprio negócio”, lembrou.

Alailson, cuja família mora no município de Orós, lançou o pequeno empreendimento com seu parceiro, o acadêmico de Enfermagem, Laudmad de Freitas Veras, 21, e também pensou na sobremesa. E assim nasceu a ideia dos ‘dindins gourmet’, os geladinhos cremosos, à base de aromas de frutas vermelhas, leite Ninho, chocolate e leite condensado, que são servidos a partir do meio-dia. No dia-a-dia do funcionamento do ‘Gula Store’, eles dividem as tarefas para boa sincronia do negócio.

Demanda de clientes

Alailson prepara o cuscuz e faz as entregas, Laudmad monta os pratos e faz os dindins. Eles também dividem o dia em duas etapas. Pela manhã, horário para a compras dos produtos e ingredientes: carnes, verduras, farinha de milho, cremes. A tarde é reservada para a produção, e a noite somente para receber os pedidos, montar e entregar.

Os pratos de cuscuz recheados com creme, molho especial, carne de sol e queijo são servidos a partir das 18h. Devido à demanda de pedidos que só tem crescido, os idealizadores já pensam em antecipar o início das entregas para as 15h e lançar os pratos no turno da manhã. “Muita gente prefere o cuscuz no café da manhã, o que se encaixa perfeitamente no nosso prato, e assim vamos angariar uma nova demanda de clientes”, frisou Alailson.

Sonho Doce

  O sonho empreendedor do Francisco Edney Carmo Rolim, ‘Edinho’, 45, começou a se concretizar em abril de 2019, um ano antes da explosão da Covid-19 no mundo. Ele criou o projeto ‘Sonho Doce’ e passou a produzir diversos tipos de salgados para lanchonetes, pizzas, esfihas, pãezinhos, coxinhas, peito de moça e outros derivados de farinha de trigo, desenvolvidos a partir de receitas especiais e sob orientação de uma nutricionista e começou a fornecer para a merenda escolar da rede municipal.

Quatro meses antes, em janeiro, quando ele deixou a empresa onde trabalhava como representante comercial, já estava amadurecendo a ideia do futuro negócio fazendo investimentos em alguns equipamentos. Edinho passou a trabalhar em casa, perto da família e fazendo o que gosta, um sonho que ele tinha guardado na gaveta e a concretização caiu de presente em suas mãos, quando a pandemia se instalou. Para isso, ele só precisou recorrer aos equipamentos, antes adquiridos, e organizar o espaço físico. Construiu uma cozinha com dimensão de 40 metros quadrados e, pronto, estava dada a largada.

Edinho lembra que contou com o aval de sua esposa Saschia Lobo Bandeira, que aprovou a nova fase da vida profissional do marido, sem ter que passar longos períodos fora de casa viajando. Com o projeto ‘Sonho Doce’, produzindo os salgados, bolos especiais decorados para datas comemorativas e o carro-chefe do negócio: o bolo inglês, o charmoso bolinho quadrado de 350 gramas, sucesso de venda e consumo.

Reinvenção

“Começamos a trabalhar, o negócio foi se desenvolvendo, começamos a fornecer para as escolas públicas”. Através de parceria com pequenos comerciantes locais, Edinho já estava fornecendo seus produtos para 7 escolas de Iguatu, Icó e Quixelô. Os comerciantes participavam das licitações, compravam os produtos a ele, e as entregas eram feitas nos dias e respectivos horários dos lanches dos estudantes. Na época, ele já havia consolidado a produção dos salgados com os bolos decorados para aniversários. Foi quando a OMS – Organização Mundial da Saúde anunciou que o coronavírus se transformava numa pandemia.

O empreendedor lembra que a crise fez acender a luz vermelha e alertou para a necessidade de reinventar o negócio lançando o serviço de delivery usando principalmente as redes sociais para divulgação, impulsionando as vendas, com pronta-entrega, estratégias que, segundo ele, estão dando muito certo. “A crise nos deu a chance de perceber a mudança de rumo do negócio, que antes a gente focava só na merenda escolar, mas que tínhamos uma clientela vasta pela frente, pronta para consumir nossos produtos, salgados, bolos decorados e o nosso carro-chefe, o bolo inglês, enfatizou.

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