O ano de 2023 pode significar um aumento de 40% de casos de câncer colorretal, somente na região Nordeste do Brasil, ultrapassando outras patologias do mesmo tipo, como pulmão, estômago e útero. Por ocasião da campanha Março Azul, o jornal A Praça convidou para entrevista o médico coloproctologista, Dr. Jader Mendonça, que faz ampla abordagem sobre a doença, as estatísticas dos casos no Brasil e como trabalhar a prevenção com o diagnóstico precoce
A Praça – O que é Março Azul?
Dr. Jader – É uma campanha de iniciativa da Sociedade Brasileira de Coloproctologia em conjunto com a Sociedade Brasileira de Endoscopia que busca a conscientização sobre o câncer colorretal. Tem o objetivo de alertar sobre a importância, prevenção e combate ao câncer colorretal. Este é o terceiro câncer mais comum no Brasil (sem contar os de pele não melanoma), estando atrás apenas de mama e próstata, sendo o segundo em mortalidade perdendo apenas para o de pulmão e responsável por mais de 20.000 óbitos no país em 2020. O Instituto Nacional do Câncer estima em 44 mil novos casos de câncer colorretal no Brasil em 2023, sendo 70% nas regiões sul e Sudeste. Apesar disso e das campanhas de conscientização, este câncer tem apresentado um crescimento importante também na região Nordeste saindo de sexto mais incidente em 2016 para terceiro, na previsão de 2023, com uma estimativa de elevação de aproximadamente 40% no número de casos neste período, passando os de pulmão, estômago e colo de útero. Em 2016, no Nordeste, este representava menos de 4% do total de câncer, já na estimativa de 2023 representa quase 7% dos casos. Provavelmente, estes dados são justificados por uma melhora no diagnóstico e notificação, mas também pelas mudanças dos hábitos de vida e alimentares de nossa população que predispõem ao aparecimento desta doença como será descrito mais à frente.
A Praça – O que é o câncer colorretal?
Dr. Jader – É o câncer que acomete o cólon e o reto, que é mais conhecido como intestino grosso, ou seja, a porção final do tubo digestivo responsável pelo transporte e armazenamento das fezes.
A Praça-Quais as causas deste tipo de câncer?
Dr. Jader – As principais causas do surgimento do câncer colorretal são alterações genéticas. Estas podem ser hereditárias, quando a pessoa já nasce, ou esporádicas, que são as mais comuns e ocorrem no decorrer da vida sendo muito associado aos hábitos de vida e alimentares. Na maioria das vezes, estas alterações genéticas formam lesões pré-malignas (pólipos) que, se não forem retiradas, evoluem para o câncer, por isso é tão importante a prevenção.
A Praça- Que sinais e sintomas são mais comuns?
Dr. Jader – O câncer colorretal é uma doença silenciosa na fase inicial, geralmente quando ela apresenta sintomas já é num estágio mais avançado, porém alguns sintomas e sinais de alerta podem chamar atenção para a investigação da doença: sangramento recorrente pelo ânus especialmente aquele sangue misturado, alteração do hábito intestinal de início recente (diarreia ou constipação), dor abdominal recorrente, anemia, catarro nas fezes, massa abdominal. Como dito acima, infelizmente, na fase inicial, a doença é silenciosa, não dando muitos sintomas, por isso é muito importante a realização de campanhas como esta para incentivar a prevenção e o diagnóstico precoce que são realizados através de exames de colonoscopia de rastreamento na população mesmo que a pessoa não apresente sintomas. Lembrando que quando diagnosticado na fase inicial, ou seja, no estágio 1, a taxa de cura é maior que 90%.
A Praça- Quais os fatores epidemiológicos?
Dr. Jader – O principal fator epidemiológico é a idade. É uma doença que aumenta a incidência com a idade, especialmente acima dos 50 anos, porém nas últimas décadas têm aumentado os casos em pessoas mais jovens. Acomete tanto homens quanto mulheres, sendo o segundo mais comum em homens somente atrás do de próstata e segundo nas mulheres atrás apenas do de mama. Outros fatores são: história familiar de câncer colorretal, doença inflamatória intestinal (principalmente a retocolite ulcerativa), tabagismo, obesidade, etilismo, maior incidência em regiões mais desenvolvidas com alimentação pobre em fibras (verduras e frutas) e rica em carne vermelha, gorduras e carboidratos (dieta de fastfood).
A Praça- Fale mais sobre esta questão dos hábitos de vida e alimentares.
Dr. Jader – O câncer colorretal talvez seja um dos que tenha maior relação com os hábitos alimentares e de vida. Uma alimentação saudável rica em fibras e pobre em gorduras e carne vermelha é um fator protetor contra o câncer de intestino, mas também protege contra outros tipos de câncer e doenças cardiovasculares, assim como não fumar, fazer exercício físico e evitar consumo de álcool. Uma vida sedentária e obesidade são fatores que predispõem uma série de doenças como as citadas acima, então é importante neste tipo de campanha a gente conscientizar sobre a importância da prevenção primária da doença que simplesmente é a busca por hábitos de vida mais saudáveis com dieta, exercício físico e evitar álcool e cigarro.
A Praça- Como é feito o tratamento?
Dr. Jader – Após o diagnóstico que se dá através do exame de colonoscopia com biópsia da lesão, o tratamento é variável e vai depender do estágio e da localização da doença.Os pólipos e o câncer bem inicial podem ser tratados e retirados pela colonoscopia não necessitando realização de cirurgia. Em tumores invasivos, o tratamento cirúrgico é o de escolha, porém dependendo da localização e do grau de invasão do mesmo, podem ser necessários outros tratamentos antes e/ou depois da cirurgia como radioterapia, quimioterapia ou imunoterapia.O tratamento do câncer colorretal é multidisciplinar envolvendo muitos profissionais da área da saúde.
A Praça- Qual a importância do exame de colonoscopia para diagnosticar a doença?
Dr. Jader – Muita coisa que falei acima corrobora a importância da colonoscopia no diagnóstico, prevenção e até tratamento do câncer colorretal. A colonoscopia tem um papel fundamental na prevenção deste tipo de câncer (chamamos de prevenção secundária) pois a maioria destes surgem a partir de lesões pré-malignas chamadas pólipos, quando estes são identificados e retirados pela colonoscopia evita o surgimento de um câncer neste local. Como dito acima, os pólipos e o câncer colorretal em estágio inicial são silenciosos, ou seja, não causam muitos sintomas, por isso é tão importante a realização de exames de colonoscopia de rastreamento, pois esta, além de diagnosticar, pode prevenir e em alguns casos tratar lesões iniciais.
A Praça- A partir de que idade deve se fazer o rastreamento pela colonoscopia?
Dr. Jader – O rastreamento na população em geral é iniciado a partir dos 45 anos, devendo ser repetido a cada 5 ou 10 anos se normal. Pessoas com história familiar de câncer colorretal ou pólipos deve iniciar a partir dos 40 anos ou 10 anos antes do caso que teve na família. Outras situações mais específicas como doença inflamatória intestinal e síndromes genéticas tem protocolos próprios. Em pacientes com história prévia de polipectomia, o tempo de rastreamento vai depender do tipo, número e tamanho dos pólipos.
A Praça – O preconceito ainda atrapalha na prevenção?
Dr. Jader – O preconceito sempre atrapalha. O exame de colonoscopia é muito importante e essencial na prevenção e diagnóstico do câncer colorretal, porém muitos não o fazem por medo do procedimento, pelo desconforto do preparo e até mesmo pelo fato de ser um procedimento endoscópico realizado através de introdução de aparelho pelo ânus. Este tipo de campanha é exatamente para conscientizar a respeito da importância da prevenção e diagnóstico precoce deste tipo de doença. O preconceito com o exame ainda é muito grande, mas tem diminuído ano após ano. Prevenir é sempre melhor do que tratar. A mensagem final é que, especialmente, aquelas pessoas que tem mais de 45 anos ou história familiar de câncer colorretal de parentes próximos (pais, irmãos e avós) procurem um especialista, verificando sempre se o mesmo tem o registro da especialidade (RQE) no conselho de medicina para fazer adequadamente seu exame de rastreio. Lembro que o exame pode ser feito pelo coloproctologista, gastroenterologista ou endoscopista desde que tenham formação e experiência para tal procedimento.
Perfil
Jader Mendonça é médico formado pela Universidade Federal Ceará CRM 11350; com residência em cirurgia geral RQE 7828; residência em Coloproctologia, Hospital Universitário Walter Cantídio – UFC RQE7829, é mestre em cirurgia pela Universidade Federal do Ceará; possui título de especialista e membro da Sociedade Brasileira de Coloproctologia; cirurgião e preceptor da residência médica de cirurgia geral e coloproctologia do Hospital Universitário Walter Cantídio-UFC; cirurgião do Instituto Dr. José Frota (IJF) em Fortaleza-CE; atende no consultório e realiza colonoscopia no Hospital São Camilo em Iguatu-CE e CCGASTRO em Fortaleza-CE.
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