Entrevista – Vilauba Araújo Articuladora do Selo Unicef em Iguatu

Jornal A Praça entrevistou Vilauba Araújo, coordenadora e articuladora das atividades desenvolvidas na cidade no ano 2017-2020

12/12/2020

A cidade de Iguatu recebeu na terça-feira, 08, o Selo Unicef, principal ação do Fundo no Brasil. O município teve avaliado o fortalecimento de suas políticas públicas orientadas à infância e à adolescência nos eixos de atenção a ações integradas de saúde, educação, proteção e assistência social da atual gestão. A certificação comprova que resultados foram alcançados. O Jornal A Praça entrevistou Vilauba Araújo, coordenadora e articuladora das atividades desenvolvidas na cidade no ano 2017-2020

A Praça – No processo de certificação, o Fundo lança diretrizes e propõe ações concretas, além de acompanhar o município e apoiar na qualificação das políticas públicas. Quais ações destacaria nesta edição?

Vilauba Araújo – Foi muito gratificante acompanhar de perto o trabalho dessa Edição do Selo UNICEF 2017-2020. O Selo está diretamente ligado à Secretaria de Educação, Ciência e Ensino Superior. Tanto a Articuladora como a Mobilizadora do NUCA fazem parte dessa secretaria. Nessa edição, o Selo oportunizou o trabalho com ações dentro dos Resultados Sistêmicos e Desafios do NUCA – Núcleo de Cidadania dos Adolescentes e Jovens. Ao todo eram 17 resultados a serem trabalhos e 8 Desafios do NUCA, cada um com várias ações e temas abordados, onde o município precisou elaborar o Plano Municipal de Ação baseado nessas ações dos Resultados Sistêmicos e passou a trabalhar de forma Interssetorial, desenvolvendo as ações para garantir e assegurar a efetivação das políticas públicas voltadas para as crianças e adolescentes e melhorar os Indicadores de Impacto Social, pois quando recebemos o primeiro Relatório dos Indicadores no início de 2018, referente aos anos de 2015 e 2016, enfrentamos um grande desafio. De 11 Indicadores de Impacto Social, Iguatu tinha 6 Indicadores em vermelho: I2, I4, I5, I6, I9, I10. Gostaria de destacar algumas ações importantes: Programa Busca Ativa Escolar, Implementação da Rede Comunitária de Proteção à criança e adolescente, Implementação da Escuta Especializada conforme a Lei 13.431/17, Ações de Promoção à Saúde do Adolescente, Prevenção da Gravidez na Adolescência, entre outras ações importantes. Conseguimos executar todas as Ações do Plano Municipal dentro dos Resultados Sistêmicos e com isso melhoramos os Indicadores de Impacto Social. No último Relatório que recebemos do UNICEF em dezembro de 2020, vimos os resultados do nosso trabalho. De 12 Indicadores de Impacto Social dessa edição, Iguatu avançou e pontuou em 10 Indicadores de Impacto, entre eles: I2, I3, I4, I5, I6, I7, I8, I9, I11, I12. Parabéns a todos pelo trabalho desenvolvido.

A Praça – Para a conquista do Selo foram elaborados diagnósticos da situação da população de até 18 anos em Iguatu, isso para criar e implementar um Plano de Ação para enfrentar os principais problemas que afetam esse grupo etário. Qual foi a realidade trazida por esse diagnóstico?

Vilauba Araújo – A política do Selo Unicef contribuiu de forma satisfatória para o fortalecimento do trabalho Interssetorial. Após a coleta de dados do trabalho realizado em rede, foi feito o levantamento da situação atual das nossas crianças e adolescentes do Município de Iguatu na faixa etária de 0 a 18 anos. Foi elaborado o Plano Municipal de Ação do Selo UNICEF edição 2017-2020, contendo as Ações de Validação, os Resultados que precisávamos alcançar, os Indicadores que precisávamos melhorar as ações desenvolvidas para efetivar essas políticas públicas e os principais envolvidos nesse processo. Esse plano foi elaborado pela Comissão Interssetorial e aprovado em assembleia pelo CMDCA – Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente. Passamos a trabalhar em rede através da proposta de acordo com a metodologia sugerida pelo Selo UNICEF e conseguimos realizar de forma satisfatória todas as ações elencadas no Plano de Ação. Com isso melhoramos de forma significativa os Indicadores de Impacto Social do nosso município, fortalecemos o trabalho em rede e asseguramos as Políticas Públicas para nossas crianças e jovens de Iguatu.

A Praça – Grande vetor nas ações de desenvolvimento para a conquista do selo foi a participação dos adolescentes na realização das atividades sugeridas para o NUCA. A ideia é tornar permanente esse eixo mobilizador na cidade?

Vilauba Araújo – Os adolescentes têm muito a contribuir desenvolvendo ações que trazem benefício a toda comunidade. O papel do mobilizador é encorajar os membros do NUCA a planejar e realizar ações que impactam positivamente a vida das crianças e dos jovens, trazendo a consciência que eles são os verdadeiros protagonistas da sua história de vida.

A Praça – Um dos indicadores de avaliação se refere à proporção de óbitos infantis investigados do total de óbitos de crianças menores de um ano. Sua importância está relacionada com a necessidade de o município criar ferramentas de análise para a investigação e intervenção das causas de morte entre crianças nos primeiros meses de vida. O ano de 2017 foi marcado por um debate envolto a esse tema, com base no aumento de óbitos de recém-nascidos na cidade. Como a política de saúde da coordenação do selo enfrentou a temática?

Vilauba Araújo – Na avaliação de políticas públicas existem muitos fatores a serem questionados de forma quantitativa e as respostas se tornam pouco claras quando tentamos explicar o ano só por números. A mortalidade se deu pelo fato das gestantes estarem desassistidas por médicos no final do ano de 2016, onde haviam 22 unidades sem médico, período que os médicos cubanos, retornaram ao seu país. Novos médicos foram contratados para suprir a carência desses profissionais. A Secretaria de Saúde intensificou as ações com o público materno infantil, aderindo a programas como o Crescer Saudável, além, claro, da grande conquista do município que foi Centro de Parto Normal de Iguatu, o único do Centro-Sul Cearense e o primeiro do Estado a ser instalado fora de um ambiente hospitalar. Também temos o Comitê de Mortalidade Infantil bem atuante, importante ferramenta para o município. Acreditamos que o triste resultado de 2017, fortaleceu a política, pois permitiu muitas mudanças que já se faziam necessárias há muitos anos.

A Praça – O percentual de gestantes com sífilis realizando tratamento adequado também ficou dentro do satisfatório. Em uma semana que o Ministério da Saúde deixou vencer um contrato e suspendeu os exames de genotipagem no Sistema Único de Saúde (SUS) para pessoas que vivem com HIV, aids (a doença causada pelo vírus) e hepatites virais, como conduzir daqui para frente, essa política?

Vilauba Araújo – Nesses últimos dias, fomos surpreendidos com a notícia da suspensão desse exame que verifica as mutações virais e podem ser prognóstico para uma mudança de medicação do paciente, porém estamos otimistas que com toda a repercussão o contrato com a empresa seja reestabelecido em breve. Esse processo nada mais é que mais uma das tentativas frequentes de desmonte da política pública do maior programa de combate as ISTs/AIDS do mundo. O que acontece no Brasil hoje é uma política reacionária baseada no obscurantismo anticientificista de um governo conservador. Ao “bater” na política a gestão fortalece sua base e atinge as minorias que aqui no caso são os pacientes do SUS atendidos pelo programa que já são frequentemente vítimas de preconceitos e estigmas. A conduta da saúde é sempre de muita luta, entendendo o SUS como um sistema de origem popular, unindo-se sempre ao órgão como a pastoral da AIDS. A conduta daqui para frente é se manter ainda mais vigilante o todo tempo, não deixando essas decisões passarem batido e através do apoio popular às contornando.

A Praça – A taxa de mortalidade entre crianças e adolescentes de 10 a 19 anos por causas externas é o grande gargalo na cidade de Iguatu. No período de avaliação 17 jovens perderam sua vida de maneira violenta. Em paralelo Iguatu teve um ano de 2018 mais violento de sua história com mais de 30 homicídios, sendo mais da metade de pessoas abaixo de 30 anos. O número nos revelou situações e práticas de violência na comunidade, como foi fortalecida as políticas de prevenção e proteção nesse âmbito?

Vilauba Araújo – A questão de redução de mortes por causas externas é um dos fatores mais complexos, porque não é algo pontual e tão fácil de resolver. É algo que passa por todo um conjunto de ações, e práticas educativas e muitas vezes esse trabalho principalmente educativo levam em média 2 a 3 anos para surtir efeito concreto. No trânsito mesmo às vezes chega há 10 anos. É quando surge a geração de condutores mais novos. Muitas ações foram feitas, como o acompanhamento desses jovens, trabalhos em escolas e comunidades, para tentar fazer com que os mesmos fossem inseridos de forma mais participativa na comunidade, acompanhamento das famílias, busca ativa de alunos que estavam fora da escola, projetos para prevenção e combate ao suicídio, implantação da educação de trânsito para esse público alvo, projetos de cultura, esporte, dentre outros para procurar afastá-los do mundo do crime. Todo esse trabalho é algo que deverá ser dado continuidade para que se obtenha o desejado nos próximos anos. Tivemos também um destaque no Projeto Vidas Preservadas, uma iniciativa do Ministério Público do Ceará, em parceria com a Associação dos Municípios do Ceará, com o objetivo de interiorização da Prevenção ao Suicídio no estado. Iniciamos esse trabalho no ano de 2018, uma parceria entre as Secretarias de Saúde, Assistência Social, Educação e Segurança Pública, considerando o fortalecimento do trabalho interssetorial e a garantia de atendimento integral e de qualidade ao usuário. Foram executadas capacitações aos profissionais e rodas de conversas nos territórios com os usuários.

Vilauba garante que os resultados foram alcançados de forma Intersetorial –

A Praça – O Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN), apontou que 335 crianças menores de 5 anos em Iguatu estão com peso alto para a idade, isso em percentual representa 9% das crianças analisadas. Em tempos que se discute a necessidade de iniciativas e políticas de combate à obesidade infantil, abrangendo, principalmente, a primeira infância, como foi o contraponto das ações da coordenação do selo?

Vilauba Araújo – A obesidade infantil é um problema que está sendo enfrentado em cenário mundial, o aumento no consumo de processados, ultra-processados e o  marketing diretivo ao público infantil tem piorado muito essa situação, portanto, acreditamos que é necessário fortalecer ainda mais as políticas públicas já implementadas na nossa cidade de Iguatu, como o Crescer saudável, Programa Saúde na Escola, Bolsa família entre outros, os programas fazem na verdade um efeito muito mais imediato do que finalístico, nos últimos anos o investimento aumentou  são necessários que os governos criem regras mais rigoroso para o controle dessas indústrias.

A Praça – O indicador do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas) que mede o percentual de crianças e adolescentes que estavam cursando o Ensino Fundamental na rede pública de ensino do município, que abandonaram a escola no decorrer do ano letivo ficou em 0.6, dentro do aceitável. O que foi percebido pela sociedade foi uma alta de crianças em semáforos da cidade, como as políticas de assistência e educação trabalharam esse assunto tão latente em nosso meio?

Vilauba Araújo – Recebemos no nosso sistema do Busca Ativa Escolar um grande desafio que é trazer de volta à escola meninos e meninas que por algum motivo deixaram de frequentar as aulas. Nós visitamos as escolas e domicílios a procura de informações sobre esses estudantes. Era notável que muitos deles estavam desmotivados por ter uma distorção idade/série. Foram criadas salas onde eles poderiam acelerar os seus estudos e conseguiriam resolver essa situação de distorção idade/série. Ainda foram ofertados cursos no Polo de Convivência, numa parceria com a Secretaria de Assistência Social e atividades esportivas, desenvolvidas junto com a Secretaria de Esporte, tentando assim manter as crianças e adolescentes em segurança. Sabemos que ainda há muito a ser feito e podemos afirmar que não nos falta compromisso em melhorar a vida dos nossos meninos e meninas.

A Praça – O percentual de crianças atendidas pelo Benefício de Prestação Continuada (BPC) que estão na escola, ficou em 67%. O número que é referência para o acompanhamento deste indicador tem como principal objetivo garantir o acesso e permanência no sistema educacional de crianças e adolescentes de até 18 anos com deficiência. Como foram detectadas as principais barreiras para o acesso dessas crianças e a sua permanência na escola?

Vilauba Araújo – Através de dados coletados nos setores de informações, como: Vigilância Sócio Assistencial e também com base nos dados coletados pelo BPC Escola, que é uma pesquisa realizada com beneficiários do BPC no intuito de correlacionar justamente aspectos dificultadores no acesso à educação para pessoas com deficiência. Através também do trabalho realizado junto aos professores do AEE – Atendimento Educacional Especializado e do CAEE – Centro de Atendimento Educacional Especializado, com orientações para as famílias junto à equipe multidisciplinar. Temos também o programa Busca Ativa Escolar, desenvolvido pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) em parceria com a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), no município. Nossos maiores problemas hoje, são as barreiras atitudinais, as pessoas precisam se trabalhar para aceitar e incluir com respeito ao próximo. As famílias precisam de orientações e acompanhamento psicológico. Trabalhamos de forma que todas as pessoas do município com deficiência e suas famílias sejam amparadas com muita responsabilidade.

A Praça – Agora com a conquista do Selo, o que o reconhecimento trará de benefícios ao município?

Vilauba Araújo – Com o resultado oficial do Selo UNICEF, os municípios recebem numa solenidade que ainda está sendo vista todos os detalhes devido ao momento de pandemia, um troféu, certificado de participação para o Articulador e Mobilizador do NUCA e a autorização para o uso da logomarca da edição 2017-2020. O município fica reconhecido em todos os segmentos do governo Estadual, Federal e também internacionalmente. A responsabilidade aumenta cada vez mais, pois a gestão pública municipal precisa fortalecer e assegurar o trabalho em rede, continuar monitorando os Indicadores de Impacto Social, promover cada vez mais o engajamento social, o compromisso de manter e assegurar as políticas públicas para os meninos e meninas na faixa etária de 0 a 18 anos, colocando como prioridade na agenda pública municipal. Os maiores ganhadores do Selo UNICEF são nossas crianças, adolescentes e suas famílias que tiveram assegurados o direito, acesso e terão a garantia da permanência das políticas públicas.

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