Fábio Vinícius Ottoni Ferreira – Promotor Público, titular da 5ª Promotoria do DECON

19/09/2020

Por ocasião da comemoração dos 30 anos de criação do DECON, órgão de defesa do consumidor, braço do Ministério Público, nas investigações de crimes contra a economia popular, o A Praça traz entrevista exclusiva com o representante do MP em Iguatu, Dr. Fábio Vinicius Ottoni Ferreira. Entre os temas abordados, o papel do DECON ao longo de três décadas em defesa e proteção dos direitos dos consumidores

A Praça – Na primeira semana de setembro o DECON completou 30 anos. O que comemorar?

Dr. Fábio Vinícius – Os consumidores têm o que comemorar nesses 30 anos do Código de Defesa do Consumidor – CDC. Quem só viveu a época pós-CDC muitas vezes não tem a exata noção da transformação que causou o Código nas nossas vidas. Inúmeros direitos dos consumidores e deveres dos fornecedores hoje estão tão incorporados nas relações consumeristas que pode parecer que sempre foi assim. Hoje ninguém concebe pegar um produto na prateleira do supermercado e não constar a data de validade ou uma informação sobre um elemento na sua composição que possa causar mal à saúde, mas antes do Código a ausências dessas informações era a regra. Então, embora ainda haver muito o que evoluir, são inegáveis os avanços para a nossa sociedade. 

A Praça – Na visão do senhor o que mudou na cabeça do consumidor ao longo dessas três décadas, na relação direitos/órgãos de defesa?

Dr. Fábio Vinicius – Hoje, indubitavelmente, a população está mais ciente dos seus direitos. A popularização da internet deixou as informações acessíveis a todos, a todo o tempo. Isso tornou o consumidor mais consciente e facilitou a busca pelos seus direitos. Se antes era demorado e burocrático denunciar uma lesão aos direitos dos consumidores, hoje pela internet mesmo você faz uma denúncia e, em poucos dias, a maioria das situações encontra uma solução, sem necessidade de judicialização. Além disso, as redes sociais também mudaram o comportamento dos fornecedores. Nenhuma empresa quer ser tachada de empresa que não respeita os direitos consumeristas, então as empresas de fato tem melhorado esses canais de comunicação com os consumidores, para evitar repercussões negativas na internet, que, rapidamente, espalham-se, manchando o nome e a imagem do fornecedor.

A Praça – O consumidor está mais consciente de seus direitos ou estamos muito aquém disto?

Dr. Fábio Vinicius – Como disse, a internet tornou o conhecimento acessível a todos. Como todo campo do conhecimento, não basta o conhecimento estar acessível. O destinatário da informação tem de ter curiosidade de se informar também. Embora a gente perceba que muita gente acabe ficando alheio a essas informações, sem dúvidas, percebemos um nível de esclarecimento hoje maior do que havia anos atrás. Muitos consumidores hoje já procuram só órgãos de defesa do consumidor para denunciar uma situação que souberam ser ilegal por conta das pesquisas e consultas que fizeram na internet.

A Praça – O DECON atua em outras frentes, além da ação específica de atender o consumidor na defesa de seus direitos?

Dr. Fábio Vinicius – O DECON é um órgão estadual, cuja condução foi atribuída, por lei, ao Ministério Público do Estado do Ceará. Em nível estadual, o DECON realiza diversas outras atividades, além do atendimento propriamente dito, como executa programas de conscientização e educação em escolas e espaços públicos, além da atividade de fiscalização nos estabelecimentos comerciais. Infelizmente, a estrutura técnica e de pessoal ainda é muito deficitária de forma que fica prejudicada a interiorização dessas atividades. A equipe de fiscalização, por exemplo, fica centrada na capital do Estado, ficando responsável por atender, na medida de suas possibilidades, a todo o Ceará. Mas faz parte do planejamento estratégico do Ministério Público a incrementação dessa estrutura nos próximos anos. Mas o trabalho desenvolvido pelo DECON de Iguatu, no que se refere aos atendimentos aos consumidores, é bastante efetivo: nossa unidade é, em números absolutos, uma das mais demandadas do Estado e temos um sucesso considerável na resolução extrajudicial dos conflitos, o que gera celeridade na resolução do problema e evita um aumento nas demandas ao Poder Judiciário.

A Praça – O tema mais atual da relação consumidor/comércio é o aumento exorbitante no preço do arroz. Isto já chegou ao DECON? Qual o primeiro passo para abrir uma investigação por abuso?

Dr. Fábio Vinicius – Essa é uma situação bem difícil, porque vivemos em uma economia de livre mercado e as relações comerciais são ditadas, em primeiro lugar, pela regra da oferta e demanda. Com a alta recente do dólar e os inconvenientes da pandemia, grande parte dos produtos e insumos tiveram seus custos de produção e distribuição aumentados, o que, de certa forma, obriga os fornecedores a aumentarem também os seus preços de vendas. Passamos por isso no país todo, com outros produtos inclusive, em outros momentos, a exemplo do álcool em gel, das máscaras, do tijolo, do feijão… Ocorre que, como já foi dito em outras oportunidades, esse contexto não justifica a prática de aumentos extorsivos, sem justificativa razoável… O aumento desarrazoado e injustificado de produtos, em detrimento de consumidor, configura infração à ordem econômica, podendo o responsável responder criminalmente. Percebendo o abuso, a população pode, e deve denunciar pelos canais disponíveis.

A Praça – Nesta fase de uma suposta pós-pandemia. Os consumidores reclamam de uma elevação sem controle dos preços de muitos produtos da cesta básica. Como investigar isso, o consumidor precisa se manifestar oficialmente?

Dr. Fábio Vinicius – Como dito, é uma apuração complicada de se fazer, pois o mercado se move pela regra da oferta e da procura. Produtos cuja disponibilidade ficou mais escassa por conta de situações próprias da pandemia tiveram, de fato, seus preços aumentados recentemente. A população pode minimizar essa situação, buscando pesquisar os preços entre diversos estabelecimentos ou mesmo procurar diminuir o consumo de determinados produtos não essenciais por um certo período até que a situação se normalize. Toda denúncia que chega ao DECON é apurada, primeiramente ouvindo o fornecedor a respeito do suposto aumento. Algumas situações do município de Iguatu já chegaram ao conhecimento do DECON e são objeto de apuração em andamento, e sendo confirmados esses abusos, serão os responsáveis responsabilizados judicialmente.  

A Praça – Aqui em nível de município o consumidor ainda tem muita limitação para ter acesso aos serviços do DECON? Tipo, saber o endereço, quais os canais de comunicação e horários de funcionamento?

Dr. Fábio Vinicius – Embora o atendimento presencial ainda esteja comprometido por conta da pandemia, o DECON sempre esteve e continua aberto às denúncias e atendimentos, por meio de seus canais de telefone, WhatsApp e e-mail.

A Praça – Existem outras ferramentas que possam melhorar a relação do consumidor com o DECON? Democratizar mais o acesso?

Dr. Fábio Vinicius – Parece consenso que essa pandemia acabou antecipando uma tendência do mundo moderno, de ampliar os canais e as atividades à distância. Com o DECON, penso que não vai ser diferente. Canais que surgiram por necessidade tendem a ficar definitivamente como alternativa aos usuários que queiram noticiar alguma irregularidade. Hoje o DECON de Iguatu faz atendimentos e vai começar a realizar audiências à distância. O consumidor iguatuense pode contatar seus servidores por meio do telefone (88) 9220-0482, que funciona, inclusive, via aplicativo de mensagens e por e-mail crdiguatu@mpce.mp.br. Além disso, temos à disposição o canal www.consumidor.gov.br que é acessível a qualquer cidadão e onde as empresas solicitadas tem 10 dias para solucionar o problema apontado.  

A Praça- Em nível de estabelecimentos comerciais ainda há muito descumprimento da Lei? Um dos itens mais faltosos continua sendo o Código de Defesa do Consumidor exposto?

Dr. Fábio Vinicius – Esse é um problema de fato ainda existente em alguns estabelecimentos. Até aproveito o espaço para conscientizar os empresários do município a cumprir a determinação da Lei, pois seu descumprimento gera multa de R$ 1064,00.

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