Família de Iguatu tem dois filhos com doença rara, a Picnodisostose (PYCD)

Os dois filhos estudam e recebem amor dos pais, mas precisam enfrentar o desafio de preconceitos sociais

02/01/2022

O Ceará tem três vezes mais crianças com uma doença rara do que outros estados. Atualização de pesquisa da Unicamp em parceria com o Hospital Albert Sabin estima cerca de 40 crianças com Picnodisostose (PYCD).

Em pelo menos 13 cidades cearenses, mais de 20 famílias enfrentam o desafio diário de obter tratamento especializado, superar preconceitos sociais, dar carinho, atenção e cuidado a mais de 30 crianças que têm uma doença rara – Picnodisostose (PYCD). O Ceará tem três vezes mais diagnósticos positivos da doença do que número de pacientes em outros estados.

Os números decorrem de um único levantamento realizado no Ceará por meio de uma pesquisa científica realizada em parceria entre a Universidade de Campinas e o Hospital Infantil Alberto Sabin, em Fortaleza, que é referência para doenças raras.

A PYCD é uma displasia esquelética autossômica recessiva, decorrente de defeito genético e é caracterizada por baixa estatura, osteosclerose, deformidades craniofaciais e fragilidade óssea. É também conhecida como a doença de Henri de Toulouse Lautrec (1864-1901) pintor francês. Em muitas vezes é confundida com nanismo.

Na cidade de Iguatu, na região Centro-Sul cearense, o casal Antônio Márcio Oliveira, 34, autônomo, e Atalene Oliveira, 32, dona de casa, são pais de dois filhos com PYCD: João Víctor Pereira de Oliveira, 11, e João Pedro, 07.

Desde o nascimento dos filhos que eles lutam para oferecer-lhes tratamento adequado no SUS. A descoberta de que o primeiro filho, João Víctor, era acometido de uma doença rara só veio aos sete meses de idade, após insistência dos pais de que havia algo errado com o bebê.

Após dois anos de casada, Atalene ficou grávida. “Aos três meses, notamos que o formato da cabeça dele começou a mudar e quando ele chorava, ficava tremendo e roxo. Era convulsão, mas os médicos não aceitavam quando a gente falava”, contou Atalene Oliveira. “Até que um dia pediatra em consulta viu uma convulsão e também percebeu que o crânio dele estava maior que o normal”.

Um médico neurologista estudou o caso, fez vários exames de imagem, mas não fechou diagnóstico, além de identificar macrocrania (crescimento do crânio). Somente um ano depois, a família conseguiu assistência no Hospital Albert Sabin e até hoje recebe tratamento especializado: neurologia, geneticista, pneumologista, ortopedia e em outras especialidades.

“João Víctor foi observado até os três anos de vida, quando fiquei grávida do segundo filho”, contou a mãe. A partir da chegada do segundo filho, João Pedro, a família recebeu autorização para participar de uma pesquisa realizada pela médica Denise Cavalcanti, da Universidade de Campinas (SP), a Unicamp, com a participação da médica geneticista do Alberto Sabin, Erlane Marques.

O levantamento epidemiológico identificou a região de Jericoacoara, Cruz, Bela Cruz, Marco como uma região onde a PYCD é prevalente. A pesquisa recebeu publicação internacional. “Quando há o casamento entre parentes que têm alteração genética, ocorre o nascimento de pessoas com PYCD”, explicou Erlane Marques. “Os filhos passam a ter as duas alterações”.

A PYCD, que é decorrente de defeito no gene codificador da enzima catepsina K, que acomete ambos os sexos e pode se manifestar em qualquer idade. Não existe cura nem tratamento específico, mas acompanhamento genético.

 

Desafio

De acordo com a médica Erlane Marques, os pacientes apresentam osteopetrose (osso duro) e por isso há enorme facilidade de fraturas. A doença não afeta o aspecto cognitivo. A inteligência se desenvolve normalmente.

Para a médica Erlane Marques, um dos desafios das famílias é encontrar consultas, cirurgias e exames pelo SUS, que é sobrecarregado. O Alberto Sabin é o único hospital de referência, mas há o apoio da Associação Cearense de Doenças Genéticas.

Dos primeiros sintomas e até serem atendidos com regularidade no Alberto Sabin, os pais de João Víctor e João Pedro sofreram dificuldades mediante a falta de condições financeiras para o deslocamento a Fortaleza em busca de ofertar tratamento adequado aos filhos.

“Lutamos e brigamos ainda hoje por direitos a transporte público e exames”, disse Atalene. “Outros pais sofrem o mesmo no Ceará, mas a situação vem melhorando nos últimos anos”.

A mãe lembra que há também dificuldades ante preconceitos sociais e até incompreensões em serviço médico local. “Um dia, João Víctor no escorregador (brinquedo) na praça fraturou o pé e a plantonista da emergência acionou o serviço social do Hospital Regional e o Conselho Tutelar porque não acreditava na nossa versão e achava que era caso de violência infantil”, relembra com tristeza. “Eles são nossos amores, damos carinho e afeto”.

Os dois irmãos estudam na escola municipal João Paulino de Araújo. João Víctor está no 5º ano do ensino fundamental e Joao Pedro cursa o 1º ano. “Eles gostam de estudar, são atenciosos e aprendem com facilidade”, disse o pai Márcio Oliveira. “São dois grandes guerreiros”.

João Víctor está com 1,23 metro de altura e pesando 33kg. João Pedro tem 1,33m e pesa 30kg. João Pedro diz que quer ser um veterinário e pintor de quadros, e João Victor queria ser jogador de futebol, mas reconhece que com a síndrome não é possível. “Era o meu sonho”, revela. “Ainda não sei o que quero ser”.

João Victor já sofreu 12 fraturas no corpo e recentemente passou por cirurgia de retirada de amígdalas, adenoide e colocação de tubo no ouvido para melhorar audição, graças a uma parceira de vários médicos e hospitais de Fortaleza (HGF, Leonardo da Vinci e Waldemar Alcântara).

“A cirurgia foi um sucesso e o meu filho está bem melhor das crises de apneias, ouvindo bem, com algumas dificuldades respiratória, mas aliviado de problemas obstrutivos”, contou Atalene Oliveira.

João Pedro teve duas fraturas nos pés e a doença se manifestou depois dos dois anos de vida. Os dois irmãos têm quase a mesma medida e peso. Em João Víctor, a doença foi mais agressiva e desenvolveu outros problemas de saúde com epilepsia, macrocania e ainda não foi fechado o laudo de transtorno do espectro autista (TEA).

Às vezes a família precisa entrar via judicial para conseguir medicação, exames e cirurgias. “Vivemos em Iguatu de forma simples e seguimos firmes na nossa jornada”, reforça Márcio Oliveira.

 

Acompanhamento

Todos os meses, os dois filhos recebem acompanhamento para avaliação no Hospital Alberto Sabin. O esforço dos médicos é para que eles levem uma vida com menos sofrimento possível. Os irmãos João Víctor e João Pedro recentemente conseguiram encaminhamento para participarem de uma nova pesquisa na área bucal para janeiro de 2022, com o objetivo de corrigir problemas para mastigação e crescimento correto dos dentes, que trazem dificuldades de alimentação.

A rotina de médicos e realização de exames são intensas. “Somos gratos, pois muitos com PYCD não tiveram a mesma oportunidade, o diagnóstico correto”, disse Atalene Oliveira. “O SUS é superlotado e há demora”.

Márcio Oliveira largou o trabalho de vendedor e passou a ser eletricista autônomo para ter condições de acompanhar os dois filhos nas consultas mensais na Capital. A mãe era atendente comercial e também deixou o emprego e passou a ser dona de casa e cuidar dos filhos por tempo integral.

A família decidiu criar um canal no YouTube (https://youtu.be/UPb37MhTCsU), em 2019, com o objetivo de encontrar pessoas com a síndrome em outras cidades do Brasil e divulgar a realidade vivenciada pelos irmãos Víctor e João Pedro, superações e incentivar outras famílias. No Instagram mostram e compartilham o dia a dia dos filhos.

“Graças aos compartilhamentos e engajamentos conseguimos criar um grupo de apoio para pessoas com a PYCD e já contamos com 19 pessoas adultas, crianças de diversas idades e de várias cidades para conversamos, trocarmos experiências”, disse Atalene Oliveira.

De um total de cerca de 200 pessoas com laudo definido de PYCD, Atalene já conheceu 30, no Brasil. “O que nos inspira é seguir firmes para um dia pode ajudar mais pessoas que como nossos filhos eram esquecidas e tratadas como aberrações”.

O contato da Associação Cearense de Doenças Genéticas é (85) 3254. 4260

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