A agricultora Marlete Cardoso, teve que colocar uma escada dentro da cisterna para pegar um pouco de água já suja para molhar as poucas plantas que tem no quintal. “Como não dá mais pra puxar, o jeito é entrar pra rapá um pouco e deixar um restinho dentro da cisterna para não rachar. Estamos sem água há mais de vinte dias. Aqui a gente depende do pipa pra ter água. Não temos água mais aqui em casa”, lamenta a agricultora moradora do Assentamento Mirassul, enquanto enxugava com uma pontinha da máscara, as lágrimas que escorriam pelo rosto.
Dona Marlete consegue ainda um pouco de água, que tira da cisterna da casa do irmão dela, que fica distante pouco mais de 300 metros. “É de lá que ainda estamos tirando. Lá tem pouca também. É tirando um poupando. Um balde d’água deixo para molhar minhas duas netinhas que mora com a gente, isso é um balde para banhar duas vezes. Elas são pequenas, se sujam mais. Mas é o jeito. Vamos nos virando”.
Realidade vivida por outras seis famílias da comunidade. “Aqui tem sete casas, duas famílias foram embora pra cidade por conta da falta de água. A gente já veio da cidade pra cá. Não tinha como pagar mais aluguel, viemos morar no que é nosso, temos casa, mas não temos água. Temos comida, porque ainda criamos umas galinhas, as chuvas ajudaram a produção de feijão. Mas não temos água”, ressalta o agricultor Jorge Fernandes, filho de dona Marlete, enquanto enchia dois pequenos baldes da cisterna de onde retira água cedida por um tio.
Sem água encanada em casa, moradores do assentamento Mirasssul, vivem a expectativa da instalação de um poço profundo, o que poderia amenizar a escassez do líquido para as mais de 15 pessoas que residem na localidade. “Vivemos essa promessa já há muito tempo. Aqui é bom de morar, perto da cidade, somos uma comunidade tranquila, mas não temos água. A gente sempre dependeu de carro pipa. Na época da seca a dificuldade é maior, no inverno, as cisternas pegam água, mas temos que usar pra tudo. Seca rapidinho e voltamos a depender dos pipas. Nossa esperança é que o poço que já foi marcado seja furado pra gente ter água em casa”, cobra a moradora presidente da Associação dos Moradores do Assentamento Mirassul Maria Cardoso.
A seca afastou muitas famílias de outras localidades vizinhas, no próprio Sítio Mirassul, virou uma comunidade deserta. Não tem mais moradores nas casas e nem acesso. “A seca e a dificuldade de acesso pra casas afastaram todo mundo. Só quem tem as casas, os moradores que ainda você por lá, é porque não abandonaram as roças, continuam a lida no campo e de tarde vem pra cidade”, lamenta Cida Dias, vice-presidente da Associação dos moradores do Sítio Mirassul.
Sem água para as higienização necessária do dia-a-dia, os cuidados recomendados pelos especialistas em saúde acabam ficando em segundo plano diante da pandemia do novo coronavírus. “O que a gente faz aqui é se isolar, não tem que vir aqui mesmo. Estamos isolados. Aqui a gente não tem escolha, água é beber, cozinhar pra tudo. Se tem dinheiro é pra comida, não tem como comprar álcool em gel como é mandado. O que tem aqui foi minha mãe que ganhou. A gente usa máscara e fica isolado”, pondera o agricultor Jorge Fernandes.
Diante dessa situação difícil, policiais militares, através do Proerd, fizeram a doação de cestas básicas e garrafões de água potável para as famílias da localidade. Mesmo com toda dificuldade de acesso por conta da estrada de acesso está bastante danificada depois do período de chuvas, os militares levaram um pouco de comida e água para amenizar a fome e sede dessas famílias. “Mesmo com toda dificuldade para chegar lá, conseguimos desatolar a viatura, não desistimos e chegamos a essas famílias. As pessoas ficaram bastante agradecidas e emocionadas. Pensaram que era até algum tipo de ocorrência. Mas foi uma ajuda que de onde menos esperavam chegou”, ressalta o comandante da 1ª Cia do 10º BPM de Iguatu, tenente Rocha. “A Polícia militar está à disposição da população de Iguatu. Essa não foi a primeira vez que a gente faz esse trabalho. Durante a pandemia intensificamos esse trabalho. Sabemos que as famílias estão precisando muito”. Mais de duas mil famílias já foram beneficiadas com doação de cestas básicas, kit de higiene e limpeza e água nesse período mais crítico e que muitas pessoas enfrentam muitas dificuldades.
De acordo com a Coordenação da Defesa Civil de Iguatu tem conhecimento da realidade que enfrentada pelos moradores do Assentamento Mirassul e outras localidades do município, que necessitam de abastecimento por carro pipa, ressaltando que providências já estão sendo tomadas para sanar o problema da água através do carro pipa. Em relação a perfuração do poço profundo, o município tem projeto em parceria com o DNOCS para a perfuração do poço, mas aguardam o andamento do projeto. Até o fechamento desta edição, ontem sexta-feira, 04, moradores aguardavam o carro-pipa. “Estamos aguardando, porque infelizmente o carro que era pra ter trazido água aqui pra gente na quarta-feira, quebrou. Veio até o meio do caminho, mas por conta das péssimas condições da estrada quebrou. Mas o pessoal da Defesa Civil, disse que vai trazer essa água pra gente. Os próprios moradores se juntaram e consertaram a estrada”, contou Maria Cardoso. A coordenação da defesa civil confirmou para nossa reportagem o relato da moradora, afirmando que providências estão sendo tomadas para levar água tão esperada para a comunidade.
Em primeiro lugar, parabéns à Polícia Militar, em especial à 1ª Cia do 10º BPM de Iguatu, por mais essa nobre ação social, de caráter solidário e fraterno, em benefício de famílias carentes da região.
Todavia, se de um lado vemos iniciativas frutíferas como essa da Polícia Militar visando amenizar a fome e a sede de famílias em situação de vulnerabilidade social, de outro lado é lamentável e inconcebível a morosidade da Prefeitura Municipal de Iguatu no atendimento ao clamor dos moradores do Sítio Mirassul pela perfuração do tão sonhado poço artesiano.
Conforme informado na matéria em pauta, o coordenador da Defesa Civil diz que há um projeto em andamento para perfuração do poço.
Mas de acordo com a moradora citada na matéria, as famílias ali ouvem “essa promessa já há muito tempo”.
Ora, como esperar que o poço realmente seja feito, se nem água do carro pipa ‘tá’ chegando no local? Como diz a agricultora do referido assentamento: “Estamos sem água há mais de vinte dias”
Não há razão para inércia da administração pública quando a demora na solução do problema possa resultar em danos à vida e à saúde da população, sobretudo em regiões carentes de serviços públicos essenciais.
A água é elemento indispensável à vida. A escassez de água ou a má qualidade desta sempre traz consequências trágicas às populações impactadas.
Cumpre, portanto, à prefeitura municipal envidar esforços para assegurar o abastecimento de água potável de qualidade a essas famílias de agricultores do Assentamento Mirassul, e empenhar-se – um pouco mais -, a fim de que o almejado “poço profundo” seja finalmente perfurado e deixe de ser apenas uma “promessa”.