Datas são marcos históricos que nos remetem a reflexões. Poderia ser apenas isso, mas não é.
O nascimento é um referencial – apenas para quem conhece o nascituro, mas é. Para o restante das pessoas, torna-se simplesmente inexpressivo, insignificante, uma rotina que mantém a humanidade e as demais espécies. O batismo, a primeira comunhão, o casamento; o primeiro amor, a primeira decepção… São apenas marcos que deixam marcas, cicatrizes. Entretanto, o “Ide por todo o mundo, pregai o evangelho a toda criatura” é um fato universal e histórico que diz respeito, apesar de todo o desrespeito hoje imperativo, a todos nós.
Falar do Natal é, além de fato histórico, uma permissividade no tempo, transitando entre o chronos e o kairós. É um nascimento que se perpetua na onipresença do ressuscitado e nos chama a atenção para o clamor do esquecimento. É um flagelo renitente, não em razão da vida que se descortina diante do véu que se rasga, mas da morte espiritual que nos afasta do verdadeiro sentido da comemoração, mais e mais, no decorrer do tempo.
‘Não somos mais os mesmos’ e nossos descendentes, ao que tudo parece, beberão em fontes ainda mais escassas de bons valores; perderão o temor a Deus, aos pais e acreditarão que apenas a racionalidade será suficiente para a resolução de todos os problemas sociais – ignorando, num aparente paradoxo, o teológico, o metafísico e o positivo. Será a era da supremacia do senso comum, com a gênese epistemológica completamente modificada e dissociada dos métodos científicos.
Não deseje “Feliz Natal!” sem estar em comunhão consigo mesmo. Não celebre o nascimento de Jesus Cristo, sem antes matar o orgulho, a vaidade, o rancor, a inveja, a soberba que funcionam como entraves da caminhada… Repare na simplicidade das crianças. Todas nascem indefesas, com o pecado original, e choram o pranto da vida que nos faz sorrir, renovando o desejo de santidade intrínseco ao homem – propósito, ultima ratio, de Deus em nossas vidas.
O Natal é a celebração da vida e da superabundância do infinito amor. Não é o comércio que se festeja ao sabor do metal. Não é o fluxo entorpecente das bebidas que celebram a libação, deixando de lado o contrito refletir e os joelhos que se prostram. Não é a ostentação de corpos que desfilam em curvas que tentam, escandalizando o olhar que peca. Não é fingimento nem recrudescimento da persona que se esquiva atrás de trapaças. O Natal é um brinde à vida, singelo, silencioso. É um encontro pessoal, familiar, comunitário e universal de cada um de nós, individual e coletivamente, com o mistério do verbo que habitou entre nós, transitando entre o chronos e o kairós.
Preparado(a) para o banquete do Senhor? Então, Feliz Natal!
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