Pablo Bandeira
É dezembro de 2021 e tô exaurido.
Fiquei esperando o tal burnout, mas não entrei em combustão ainda. Nada apoteótico, apocalíptico, nenhum curto-circuito dramático, pico de exaustão ou explosão de faíscas que justificasse minhas falhas ou ausências, que desse conta de explicar por que não quero mais.
Fiquei esperando o surto vir, sentado pacientemente no elevado platô do visual gráfico do meu cansaço. Lá de cima, só deu para sentir um vazio persistente. E sempre me recusei terminantemente a fazer do nada um assunto. Infelizmente, é só nada que tenho para qualquer começo de conversa. “Tô muito cansado”, “Que sono sobrenatural”, “Acho que vou me atrasar uns dez minutos”… Seguimos!
Na minha cabeça 2019-20-21 são a mesma coisa e acho que sempre será assim, na verdade, eu prefiro que seja assim, não lembrar direito é um favor que a gente se faz.
Tenho uma porção de lembranças que no futuro não serão de um ano específico em especial, não tem mais aquela do 7×1 da Alemanha, mas “da pandemia”. A interminável sensação de cansaço é uma delas, 2022 talvez continue assim, mas para além do pandêmico e do indizível teremos carnaval, eleições e futebol para marcar o tempo. Ainda não terminou, mas eu já gastei energia suficiente para saber do que a pandemia vai nos lembrar.
“Desconectado do seu brilho”. Escuto as palavras da minha terapeuta com atenção, sempre grato por existirem pessoas acendendo fósforos em meio à escuridão. Nos anos anteriores não tinha nada assim, mas hoje tinha Layla e Paulla ocupando as portas de saída do pensamento e me lembrando que mesmo que dezembro ainda nem tenha chegado na esquina, não sou apenas eu que está tentando.
Às vezes o brilho volta, em espasmos. Primeiro aos olhos, depois ao rosto para seguir para aquele falatório insaciável sobre qualquer assunto. Na maior parte do tempo, preciso recorrer aos velhos truques, como um mágico de festa infantil em fim de carreira. O maior truque de todos é continuar, ainda que pareça dar em lugar nenhum. Ainda que pareça que já fui deixado para trás.
Tanto continuei que em meio a um grande nada esbarrei com um ditado japonês no Twitter de um jovem professor de karatê que, por acaso, também é biólogo: Keizoku wa chikara nari. Em tradução literal, “continuação é poder”. O poder está na prática contínua, em se manter fazendo. A importância de se manter de pé e resiliente.
Rascunho dois, três, quatro diferentes textos para começar a Introdução da temida dissertação. Começo a trabalhar furiosamente em organizar as aulas da faculdade. Me debruço sobre a planilha de Excel que todo mundo já perdeu a fé que vai ficar finalizada. Sem saber por que, sigo na contramão do meu desejo de sumir. Talvez eu só continue porque estou cansado demais até mesmo para pensar num Plano B.
Então desisto de inventar história, de abordar o assunto com alguma criatividade, como quando escrevi sobre os passeios de topique. A festa é minha e eu choro se eu quiser. Me agarro à verdade, o único truque que me restou, e a verdade é que o assunto que eu estava evitando era a única coisa que eu realmente tinha para dizer.
Agora eu vou tirar um cochilo e quando eu estiver menos cansado volto aqui para contar.
Um beijo,
Pablo.
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