Manhãs de dezembro: tá todo mundo ajeitar algumas coisinhas

03/01/2022

Pablo Bandeira

 

Estamos no final de dezembro então faltam mais ou menos uns dias e tanto para virar o ano, aquela ocasião em que a gente renova votos por costume. A virada de ano 2021-22 é especial visto que (pelo menos é o que pensamos agora!) trará um novo ano sem pandemia: enquanto escrevo a vacinação no Ceará já ultrapassou 65% da população adulta, desde agosto a taxa de mortalidade vem baixando paulatinamente. No estado, não na cidade. É muita coisa.

Virada de ano é sempre momento de celebração e a de 2020-21 só foi ok para quem é meio assim das faculdades mentais, então o 31 de dezembro próximo tem um jeito especial de esperança – apesar de tudo mais que continua aí independente da pandemia, vocês sabem quem, etc.

Virada de ano é especial também pela simbologia de permitir-talvez-quem-sabe-assim-vamos-acreditar-um-pouquinho alguma energia para deixar para trás certos pesos. Todos carregamos algumas culpas. Tirando criancinhas, ninguém que sobreviveu até aqui está isento de pecados. Todos temos nossas mancadas para engolir e olhar pra elas com clareza é sempre bom, porque a única coisa pior que a realidade é a negação da realidade (não fui eu, foi Voltaire). Pena que às vezes a verdade é intranquila e não existe apego ao realismo otimista realidade que conserte.

Então ainda temos algo como 6 dias para consertar erros (eu não faço as regras, só participo do jogo, ok?). Claro que você vai poder consertar depois, mas aí perdeu um tanto da simbologia e rituais são importantes. É claro que há erros insolúveis, mas espero que você que me lê esteja pelo menos tentando lidar com os seus sem jogar pra baixo do tapete – estamos na lunação de Virgem e, dizem as místicas, é hora de jogar muita coisa no ventilador. Independente de lunações, fim de ano é auspicioso para perdoar ou tentar solucionar algo.

Eu tenho a minha lista de erros – e, não, não vou compartilhar com vocês, não compartilho direito nem com a minha terapeuta, viciada que sou em performar o corretinho, pra mim é importante viver na ilusão de que os erros não são meus ou, durante algum arroubo de martirização interior, achar que todos erros são meus. Canceriano né, amigos?

Não tô falando de dívida de cartão de crédito (essas, também). Erros podem ser aquela promessa de cuidar da saúde que você ainda não cumpriu e te trouxe, sei lá, uma alta na glicose (o Brasil me obriga a comer chocolate pra repor serotonina). Isso dá tempo de cumprir, nesse ano ou no outro, mas não demore demais. Erro pode ter sido entrar num relacionamento zoado cheio de autoengano e toxina. Dá tempo de assumir pra você mesmo e sair dessa. Erro pode ter sido, pelo contrário, dar um perdido numa sorte de amor tranquilo que num universo paralelo nesse momento está te fazendo uma pessoa muito feliz. Talvez dê tempo de se perdoar pela mancada e correr aéreas do prejuízo – mas não existe, claro, garantia de que a outra parte sinta o mesmo, inclusive a fila pode ter andado. Quem nunca?

Seu erro pode ter sido perder um trabalho ou pegar um trabalho ruim, pode ter sido parar de falar com parentes, perder a compostura numa briga de Twitter, deixar de pagar um boleto importante e gastar o dinheiro em outra coisa achando que tinha sobrado. Seu erro pode ter sido escrever pro/a ex tentando voltar, seu erro pode ter sido se envolver numa fofoca escrota que queimou seu filme com uma pessoa de quem que você gostava, seu erro pode ter sido tomar multa no novo fotossensor indo pro Novo Altiplano – não fui eu, eu juro – ficar preso em congestionamento, ou pior, ter sido a causa do congestionamento, seu erro pode ser sido acreditar que tal pessoa mudou, mas quem muda de verdade?

Pode ter sido, sei lá, terminar uma amizade porque o/a ex-amigo/a chama vacina de “vachina” – apesar que aí acho que é capaz de ser acerto. Seu erro pode ter sido deixar passar uma boa proposta de trampo, pode ser sido comer aquele sanduíche natural de rodoviária sórdido em terríveis aspectos e que te acompanhou por uns três dias, pode ter sido assistir todos os episódios Castlevania pra recuperar a nostalgia.

O que eu quero dizer é: nos stories pode até parecer que sim, mas ninguém chegou até aqui incólume. Talvez algum padre mais santificado por aí, mas não tenho certeza. Eu, por exemplo, errei horrores esse ano.

Até o próximo dezembro. Um beijo natalino,

Pablo.

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