Seria animador, não fosse demasiado tarde, o pronunciamento do presidente do STF, ministro Luiz Fux, em repúdio às recorrentes investidas de Jair Bolsonaro contra a democracia. Em se tratando do Brasil contemporâneo, contudo, menos mal que a mais elevada corte finalmente tenha feito valer o seu papel enquanto instituição respaldada em amplos poderes constitucionais.
Quanto ao manifesto em defesa de eleições, alardeado pela grande imprensa, no entanto, há que se atentar para o que está por trás da iniciativa idealizada por gente que não só apoiou e continua a apoiar o governo federal, ou seja, empresários e banqueiros preocupados tão-somente com seus interesses econômico-financeiros.
A declaração do presidente do Credit Suisse no Brasil (e destacado signatário do manifesto), por exemplo, é incontrastável nesse sentido: “Não dá para a gente assistir a isso calado. É ruim para o Brasil, para todo o mundo, inclusive para o governo. Está na hora de o governo rever a sua posição. Estamos vendo o princípio de uma recuperação econômica e queremos avançar”, disse ele ao jornal Folha de S. Paulo.
Não é preciso ser nenhum especialista em análise do discurso para perceber o que move o ‘banqueiro’ e, por extensão, a turma da Faria Lima: pressionar o governo no sentido de ajustar-se ao que interessa aos donos do dinheiro no país. No caso, conter a repercussão negativa que o autoritarismo e as ameaças de golpe naturalmente vêm projetando sobre os números da economia.
A acrescentar elementos que os fazem aparecer bem na fotografia, note-se o fato de que banqueiros e empresários figuram ao lado do que se convencionou chamar de elite intelectual do país. Posam, nos limites das circunstâncias, de bem intencionados, comprometidos com a preservação do Estado de Direito e outros valores próprios de uma democracia. A garantia de que se terá eleições, por exemplo. Mas nada que aponte criticamente para o engavetamento de mais de 120 pedidos de impeachment de Jair Bolsonaro pelos numerosos crimes cometidos na contramão do que agora dizem defender. É manifesto meia boca.
Sob este aspecto, atente-se para o que diz Carlos Ari Sundfeld, professor da Fundação Getúlio Vargas – SP e um dos principais autores do texto do manifesto: “Não existe uma ilusão na Faria Lima com as vantagens do autoritarismo. É o contrário. A elite financeira do país está associada à elite intelectual e defende a democracia. Quando as pessoas se manifestam, é porque sabem que inclusive seus próprios negócios não vão ter benefício se essa escalada seguir”, disse à Folha, como num ato falho que põe em evidência o real significado da iniciativa.
Para o bem e para o mal, por essas e outras, é que chego à dura conclusão: nada mais parecido com um progressista do que um empresário sob riscos de perder dinheiro por ações do governo que apoiou com entusiasmo. É voltar a 2016 (golpe contra a presidente Dilma Rousseff) e às eleições de 2018 para entender o que digo.
Álder Teixeira é Mestre em literatura Brasileira e Doutor em Artes pela Universidade Federal de Minas Gerais
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