Com pouco mais de 50% da capacidade, o açude do governo, que fica na localidade de mesmo nome, no Distrito de José de Alencar, na zona rural de Iguatu, é a principal fonte de abastecimento para mais de 90 famílias. Nos últimos dois anos, o açude ficou completamente seco e os moradores enfrentaram muita dificuldade para ter acesso à água.
Eles temem que a situação volte a acontecer. “Só a gente sabe o que enfrentou com a seca. Aqui ficou só um riacho bem longe da bomba. A gente andava no açude na terra seca e rachada. Somos gratos a Deus por ter essa água. Agora querem liberar de novo. Como já aconteceu, se fosse água para pessoas usarem, a gente não era contra. Mas liberar água pra pessoas plantarem capim para animal, isso é injusto”, reclama o agricultor Euridan Araújo, enfatizando que o bom aporte hídrico trouxe a oportunidade de os moradores terem acesso ao peixe. “Estamos até esperando um peixamento pra cá, mas se secarem nosso açude como vai ser? Vamos ficar sem água e sem comida?”.
Os moradores não são contra a liberação da água para o abastecimento humano e nem animal, mas não aceitam que o líquido seja destinado para produção de pastagem. “Nosso açude tem água, mas ele é raso. Ao longo desses anos, foi aterrado demais. A gente viu e ainda vê o tanto de terra descoberta dentro dele. Isso é revoltante. As comunidades de baixo têm açudes, têm poço. Dos anos que ficamos na seca, recebemos água através de pipa. E as comunidades mais de baixo tinha água. É injusto!”, ressalta a dona de casa Lara Rafaela Bispo.
A liberação da água está sendo reivindicada por produtores rurais de outras comunidades ribeirinhas do rio Carnaúba. “Pra gente é nossa maior riqueza. Se essa água for liberada, vai ser uma destruição, isso porque não tem canal, não tem tubulação pra ela ir com garantia que iria chegar até depois da pista (CE-060) numa distância de quase 5 km, até lá ia encher os barreiros e açudes até chegar no Angelim. Se liberarem, vai só se espalhar nas terras”, aponta o vice-presidente da Associação de Moradores e Agricultores do Sítio Açude do Governo, Marcelino Soares.
Outra questão que preocupa moradores é a falta de definição clara de quem é responsável por gerir o uso da água do açude. “Iremos acionar o Ministério Público para acompanhar todo esse processo. Porque agora a COGERH e o Comitê da Bacia do Alto Jaguaribe é que podem decidir essa liberação da nossa água, através de voto. Precisamos saber quem realmente é quem administra nosso açude, que é nosso é da comunidade”, pondera Euridan.
Impasse e dúvidas
No dia 24 de agosto deste ano, a Companhia de Gestão de Recursos Hídricos – COGERH coordenou uma assembleia extraordinária virtual com participação dos integrantes do comitê da Bacia do Alto Jaguaribe, convidados residentes e proprietários de terras no Sítio do Governo e às margens do riacho Carnaúba, com como a finalidade discutir a viabilidade da liberação de água. “Mas ocorreu problema com a votação, tendo em vista que foram contabilizados mais votos do que votantes presentes, motivo pelo qual o resultado foi anulado, sendo marcada nova votação para o dia 31, passado, só que não aconteceu justamente porque estamos nesse impasse. Aguardamos uma posição da COGERH”, explicou Lara Rafaela, acrescentando que ainda durante a assembleia houve falas que geraram dúvidas diante dessa liberação, como consta no relatório da análise do processo de liberação feito pela Associação de Moradores. “Na assembleia, houve quem falasse que a água seria utilizada só para o consumo animal e que não seria utilizada para irrigação, enquanto em outro pronunciamento foi falado que a água seria utilizada para irrigar pastagem para o gado, de forma que pareceu muito confuso e desorganizado”.
De acordo com a gerência da COGERH da Bacia do Alto Jaguaribe, a alocação da água do reservatório é feita pelo comitê. “Em relação a liberação da água do reservatório está sendo feito um trabalho de campo, levantando todo o trecho do rio, das pessoas que possam ser beneficiadas ou não com essa água, para se ter o conhecimento da real demanda dessa possível liberação. A companhia espera o resultado da batimetria feita no açude, para munir o comitê gestor para uma tomada de decisão mais adequada possível, dentro da lei, das regras que determinam a gestão dos recursos hídricos”, esclareceu Anatarino Torres, gerente da regional da COGERH.
O açude do governo foi o primeiro reservatório público construído em Iguatu, concluído no ano 1888, ainda no tempo do Império. Na década de 1950, foi ampliando com a construção de outra parede.
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