Honório Barbosa
Especial para o A Praça
Na cidade de Iguatu, a exemplo de outros centros urbanos, há muitos vendedores autônomos de lanches, doces, salgados, que percorrem diariamente ruas e empresas oferecendo os seus produtos. Lucineide Alves de Sena, 47, é uma dessas trabalhadoras, que enfrentam o sol quente, pela manhã e tarde, a pé, vendendo filhós (feito de goma, massa de mandioca, frito no óleo), uma iguaria muito apreciada no sertão nordestino.
Ela chama a atenção dos moradores pelo tempo de trabalho e por usar peças do vestuário que combinam com o período que se vivencia. Agora, começou a usar um gorro e assume a personagem de ‘Mamãe-Noel’. Ao longo do ano usa roupa de vaqueira, de agricultora e nas festas juninas sai de chapéu de couro e vestido com estampa quadriculada, no estilo caipira. Os filhós são vendidos postos em uma bacia.
Nesse período de pandemia, o uso da máscara é indispensável, mas a vendedora lamenta a queda nas vendas – cerca de 40%. “As pessoas ainda estão com medo, não querem que a gente se aproxime”, pontuou. “Antes, vendia uns cem filhós por dia, agora caiu para sessenta”. Quem é vendedor autônomo tem de ter coragem e disposição diária, pois é a partir do trabalho que consegue o ganho para viver. “Se não trabalhar, não ganho, e como vou comer, viver?”, ensina. “Graças a Deus, criei duas filhas, agora estou criando um netinho de seis anos, tenho saúde e vontade de trabalhar”.
Estação
Lucineide Alves de Sena tem uma história de vida daquelas pessoas que começaram a trabalhar cedo e perderam parte da infância, sem estudo e com pouco tempo para brincadeiras.
Era preciso ajudar a mãe, Aurineide, que fazia e vendia tapioca, peixe frito, café, chá, bolo, água, pastel, filhós, na estação de trem. “Comecei trabalhar aos oito anos vendendo para os passageiros do trem que fazia a linha Fortaleza para Juazeiro (do Norte)”, contou. “Era um tempo bom, vendia bem, e trabalhava em só lugar, mas hoje tenho de andar muito e vendo pouco”.
O trem passava diariamente em Iguatu às 7 horas e às 19 horas. Dos tempos de criança e adolescente na estação ferroviária ficaram boas lembranças. “A gente vendia água fria, em quartinha de barro e em copo de alumínio”. A água era servida no mesmo copo para várias pessoas. “Não tinha doença, como agora”, comparou.
No período de 1997 a 2007, Lucineide Sena foi morar e trabalhar em São Paulo como empregada doméstica, faxineira e vendedora de lanches. Depois retornou a Iguatu e decidiu vender apenas filhós. “Sou a mulher dos filhós”, frisou. Ela aprendeu a fazer a iguaria com a mãe.
Até morrer
E qual o segredo para conseguir vender: “É tratar bem os clientes e agradecer a Deus”. Separada, tem duas filhas casadas. No ano passado, uma das filhas ficou viúva e a avó passou a criar o neto de seis anos de idade, que às vezes a acompanha nas vendas, pelas ruas da cidade.
E o que Lucineide Sena diz da vida? “Dou graças a Deus por estar viva e agradeço por ter vencido, criado minhas filhas”. E até quando, quer trabalhar? A resposta vem na ponta da língua: “Quero continuar vendendo até morrer”.
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