Liberando a jovem Laura do interrogatório e da retenção preventiva, tendo a sua mãe assinado um termo de responsabilidade para com a sua filha, o delegado notou uma certa semelhança entre a sua caligrafia e a caligrafia do tal Armando, suposto amante da jovem. De pronto, Andreas achou pertinente fazer algumas perguntas à velha semianalfabeta.
Já era início da madrugada quando o investigador deixou a delegacia. Encontrava-se, agora, em um bar simplório da cidade. Repousava em sua mão um copo de conhaque barato. Em sua mente, a presa de cabelos alvos continuava a incomodá-lo.
A velha arquitetara o plano contra a própria filha. Enquanto bebia, explicava o caso para um amigo de longa data, o Carlos. O investigador Andreas relatou que foi a mãe da jovem Laura quem escrevera a carta e a colocara no baú da filha. O plano era, até certo modo, simples: queria ludibriar a polícia e, assim, esconder, evidentemente, o que estava por trás de tudo isso.
Bem, velha dopara a filha no dia do ocorrido, e a seguiu no seu trajeto até a casa do namorado da jovem. Ao chegar na frondosa árvore, empurrou sua cria, que desmaiou por estar grogue demais. Nisso, forjando uma queda da árvore, passou a casca da árvore nos sapatos da garota e, claro, arranhou a árvore, para parecer ter sido a jovem na tentativa de escalá-la.
E como explicar a carta, uma vez que a velha não passava de uma semianalfabeta? Simples. Ela confessou que pediu para uma amiga de infância criar, prometendo que a redigiria de próprio punho – daí o fato de ter sido descoberta. O clima misterioso e místico do bilhete foi precisamente para dar um ar de puerilidade e inconsequência dos adolescentes, fazendo parecer crível uma possível traição da jovem para com o seu namorado.
A razão para tudo, o motivo para essa loucura da senil senhora não era oriunda da sua avançada idade. Quando jovem, ela, a velha, envolvera-se com o pai desse jovem namorado da sua filha, e ela suspeitava de que eles fossem irmãos, daí, escondendo essa suspeita e esse segredo, resolvera agir tão desesperada e inconsequentemente.
A senhorinha há meses vinha dopando a sua filha, tentando fazê-la crer que estava ficando louca. Relatou que, em meio aos devaneios da filha, iria contar sobre a possibilidade de ela e seu namorado serem parentes. Torcia para que a jovem, confusa entre a realidade e a fantasia, desistisse do romance e não compreendesse que a mãe fora a contadora da medonha história.
Andreas tomou um porre e dormiu. Meses depois, o resultado do exame de DNA: a jovem Laura não era irmã do seu namorado. E a velha, que cumpria a sua pena pacificamente, dizia, agora, ser a mãe do inspetor Andreas…
Cauby Fernandes é contista, cronista, desenhista e acadêmico de História
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