“Pour ouir dans la chair pleurer le diamant”
Mallarmé
Certa vez o poeta simbolista francês Stéphane Mallarmé (1842-1898) respondeu com muita argúcia a uma pergunta do pintor, seu amigo, Degas. Este lhe havia inquirido sobre os herméticos poemas, afirmando não conseguir compreender as metáforas e imagens. Mallarmé então saiu-se com esta bela assertiva: “a poesia faz-se com palavras, não com ideias.”
Há certo exagero nisto. Todavia o bardo queria destacar o dom alquímico do poeticum verbum. Mais do que nenhuma outra escola literária o Simbolismo atinou com tal aspecto da criação artística. Não raras vezes o poema é puro sortilégio, rêverie, magia musical. Por isso mesmo é plurívoco, cheio de porões semânticos.
Há muitos, muitos anos escrevi este soneto alexandrino clássico, mas de feição simbolista. Oferto-o ao bom leitor. As imagens são obscuras, às vezes, mas la musique deve guiar a boa estesia.
ALOENDROS
Ah cabelos que sois reinos de Eros e Floras…
Quando orardes, lembrai, a carne é transitória!
Das legendas d’Antanho eu sou a velha história
Do que apenas amou cinzas, passos e outroras.
Tão branca a Santa a orar… Rainha! Livro de horas!
A minh’alma, criança, era doce e ilusória;
Ah cabelos que sois bandos de aves canoras,
Quando amardes, lembrai, anjos não têm memória!
Um sonho visitou-me: uma igreja brumal,
Onde o Infante chorava o Velho num caixão;
E ambos eram meu Ser. Comédia de vitral!
Num crisântemo azul a Santa se esvaía…
Lembranças, retornai. O túmulo é um perdão?
Ah cabelos que sois eflúvios de elegia…
Professor Doutor Everton Alencar
Professor de Latim da Universidade Estadual do Ceará (UECE-FECLI)
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