Grande foi a impressão causada pelo novo professor de Geografia. Não se sabia de onde vinha, quanto tempo ia ficar e, coisa estranha, nem o que pensava. O antigo professor, que se encontrava gravemente enfermo no hospital, entre a vida e a morte, costumava dizer o que pensava sobre cada tema, cada tópico, cada polêmica brasileira.
Mas Rubens, o substituto, explicava de um jeito novo, tão novo que os alunos já haviam enterrado o professor antigo antes mesmo da notícia de sua morte.
Era bonito, o novo professor. Uma cocotinha chegou a comentar em alto e bom som, na frente dos demais professores, “Até que enfim um professor bonito na escola”.
Outro professor, não sabemos se por coleguismo ou inveja, chegou a alertar o novato: “Cuidado. Sabe quem é muito amiga da escola agora? A delegacia”. Passou o alvoroço das primeiras impressões. Mas as notícias não paravam de voar.
Um dia, uma dessas notícias voou até à casa de Abigail, que era aluna veterana, mas estava afastada há um ano do colégio por motivos terapêuticos. O tema, que era mais um assunto, era o seguinte: a calça colada que o professor havia usado na aula.
Lora e Maira, irmãs mais novas de Abigail, treze e quinze aninhos, respectivamente, ficaram impressionadíssimas. “Tu precisava ver. Ele lembra muito o Gustavo Lima. Nenhuma de nós conseguia se concentrar na aula”. Tentavam, assim, animar a irmã, que era uma depressiva nata, dessas que andam com o olhar vago, sempre à deriva da vida.
Abigail não achava graça em nada.
Há pouco completara dezoito primaveras e nunca havia levado a sério nenhum rapaz. “São todos uns bocós, uns mongoloides”, dizia de si para si.
Dia após dia, porém, as irmãs traziam novas informações. O que mais intrigava Abigail era a falta de dados pessoais do novo professor. Ele não falava de sua vida. E, mais estranho ainda: não tinha redes sociais. “Será que é casado? Se é, esconde a aliança”, dizia Maira, a irmã do meio e cujos hormônios foram muito afetados pelo novo professor. Aos poucos se instalava uma disputa entre a irmã mais nova e do meio sobre quem seria a preferida do mestre.
Abigail, a princípio, viu nisso uma diversão e uma oportunidade para despistar sua antiga depressão. Começou a colocar irmã contra irmã. A Lora, dizia que talvez ela fosse a preferida do professor, por ser muito esperta e inteligente. A Maira, dizia que ele devia olhar para ela disfarçadamente, já que era a mais bonita da escola.
Mas de tanto ouvir falar de Rubens, o substituto, Abigail sentiu, pela primeira vez em anos, vontade de estar na escola. Era o fim do ano letivo quando percebeu que estava completamente apaixonada.
Mistério e anonimato cercavam o amor nascente. Ela só o conhecia pelas descrições das irmãs. “E agora? Não há mais como voltar às aulas; não tenho coragem de ir visitar a escola. Qual seria minha desculpa? Não, não posso…”.
Diante do impasse, a melancolia de Abigail ia crescendo junto às desavenças das irmãs sobre qual delas tinha a preferência do professor. O lar estava em frangalhos. Foi então que os pais resolveram intervir.
Não precisou de interrogatório.
Maira entregou logo que a irmã mais nova estava se apresentando para o novo professor; Lora devolveu que era Maira quem estava se enxerindo para o docente; e Abigail gritou com as duas e pediu respeito ao mestre desconhecido. E chorou.
– Eu gosto dele! Para vocês, ele é apenas uma novidade. Para mim, é para sempre. E fiquem sabendo: de nós três só eu tenho o número na identidade que permite ele gostar de mim também.
Não espere muito das novas tragédias, pobre leitor! Elas são de Lince. O professor substituto, que nunca soube do drama, foi trabalhar em outra escola; o antigo professor faleceu, já adiantado em idade. As irmãs mais novas logo começaram a namorar rapazotes. E a nossa Abgail continuou sendo triste. Mas nunca se esqueceu do eterno professor substituto.
Marcos Alexandre: Pai de Edgar, leitor, Professor de literatura e redação, cinéfilo e aspirante a escritor.
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