Para os meus amigos que se dizem ateus; que ouçam e encontrem a paz.
Era um começo de semana; uma nebulosa segunda-feira. Eu não estava com ressaca; não tinha bebido no dia anterior. Não bebo mais no domingo, não tenho mais saúde para isso. Estava bem; talvez um pouco melancólico. Mas é próprio das segundas-feiras. O dia da devoção às almas.
Na minha antiga radiola eu ouvia Johan Sebastian Bach (1685-1750). Um vinil com alguns concertos e a belíssima obra Jesus, Alegria dos Homens. Invadiu-me então um profundo sentimento de paz, de satisfação interior ao ouvir aquela música. Deleitei-me intensamente. Mas, já perto do final, refleti. Quando esta melodia acabar onde encontrarei outra vez esta paz? Não posso ficar o resto da vida a escutar esta música. O que farei?
Assim pensando, busquei nas minhas memórias onde tinha sentido algo parecido com aquela plenitude ao ouvir Bach. Procurei no trabalho, nas realizações profissionais; ela não estava lá. Procurei nos amigos e companheiros por toda a vida; não estava; busquei na família, parentes próximos e distantes. Também aquela paz lá não havia. Devo dizer que nestes três recantos, por certo, havia algo similar, igualmente bom e confortante. Mas não era exatamente e plenamente aquela sensação.
Fui então ao meu vasto mundo profano. Mulheres, vinho, charutos, sexo e noitadas boêmias. A paz da música de Bach sequer passou perto dali. Procurei então no amor, ou pelo menos no que julgo ser tal cousa. Nas poucas vezes que creio ter amado, ter me entregado totalmente, quase toquei aquele sentimento de paz. Mas até nestes momentos foi fugidia e enganadora a sensação. Frestas, apenas frestas. Sequer uma janela. Nunca uma porta para algo como aquela paz da melodia de Bach!
Já quase findando a melodia naquela cinzenta segunda-feira, eu realmente me sentia triste. Súbito, Deo gratias, veio uma epifania. Olhei para o meu lado, para um velho oratório que tenho, com muitas imagens de santos queridos. Vi um antigo crucifixo e nele, bem nítido, o rosto de Jesus. Cansado, pendido para um lado, cheio de chagas. Os espinhos… as marcas do sagrado sangue… os olhos semicerrados.
Na velha radiola a música havia acabado. Mas eu ouvi, claramente ouvi, na minha alma aquela música continuar. A paz de Bach estava ali. Era a face de Jesus!!!
Professor Doutor Everton Alencar
Professor de Latim da Universidade Estadual do Ceará (UECE-FECLI)
0 comentários