“Foi morta pelo poder/que queria silenciar/a sua voz de denúncia/e a extrema rebeldia/com palavras de luar”.
(Maria Teresa Horta, sobre Marielli)
Às vésperas do Dia da Consciência Negra, comemorado ontem como forma de desconstruir o mito da benevolência de uma princesa branca contra o racismo, o Brasil dá mais uma incontrastável prova de viver um tempo de horrores no que diz respeito à questão racial.
Primeira negra eleita na cidade de Joinville, a professora Ana Lúcia Martins, do PT, vem sendo alvo de ameaças assumidamente fascistas, coisa de resto já esperada num país que tem como presidente Jair Bolsonaro.
Mal saído o resultado das urnas, na segunda-feira 16, acumulavam-se mensagens no Twitter que indicam correr Ana Lúcia os mesmos riscos que culminaram com o assassinato da vereadora Marielli Franco, no Rio de Janeiro, há pouco mais de dois anos.
As mensagens, segundo depoimento da advogada Andreia Indalencio Rochi, à Folha, “falam que precisam matá-la para um suplente branco assumir, que fascistas mandam e que ela precisa se cuidar”. Com Marielli, sabe-se, em inícios do seu mandato como vereadora do Rio de Janeiro, ocorreu exatamente isso. Até que se cumprisse o que diziam essas ameaças, num crime hediondo que, mesmo não esclarecido em sua totalidade, tem evidências apontadas para um endereço bastante conhecido do Rio de Janeiro.
A poucos dias do segundo turno das eleições para prefeito em 57 cidades com mais de 200 mil habitantes, nas quais 28 candidatos pertencem a partidos de esquerda ou identificados a ela, pode-se perceber que está em jogo muito mais que o destino administrativo de cidades. Das urnas, a 29 deste mês, sairá uma forma de pensar o país, o Estado de Direito e a democracia.
A professora negra Ana Lúcia, eleita vereadora em Joinville, é do PT, legenda que dobrou a sua participação no segundo turno em relação à última eleição para prefeito – e participa do processo, este ano, com o maior número de candidatos.
Não é pouco, diga-se por fim, para um partido que as vozes do fascismo no Brasil afirmam ter degringolado.
Álder Teixeira é Mestre em literatura Brasileira e Doutor em Artes pela Universidade Federal de Minas Gerais
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