Francisco Graciano da Silva, 72, é filho do sítio Jurema, zona rural de Jucás. Migrou para Iguatu com os pais João Pereira e Marina Diniz, em 1960, fugindo da vida difícil no lugar que oferecia quase nada em qualidade de vida e conforto. Saiu com a única irmã Maria, numa carroça, numa viagem de 5 horas pela estrada carroçável até Iguatu, transportando uma cantareira, dois potes, uma mala com as roupas e o cachorro Peri. Os pais tinham viajado na frente para preparar o local aonde a família iria morar.
Hoje, 63 anos depois, Graciano é reconhecido como o fabricante das melhores ferramentas para agricultura, construção civil e outras atividades no solo, vegetação ou de produção. A empresa Sucata Graciano fica na Rodovia CE-60, à altura do bairro Esplendor, saída para Acopiara. É fabricante de enxadas, chibancas, picaretas, alavancas, foices, roçadeiras, machados, torções, pé de cabra. Diferentemente da fabricação no molde mais rudimentar em que o ferro é forjado a fogo e marreta, Graciano usa as máquinas mais modernas para produzir suas peças para o Centro-Sul, o Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Piauí. Gera cerca de 15 empregos diretos. A empresa se modernizou no que fabrica e nos equipamentos que usa, mas não perdeu a originalidade de suas características de sucata, com seus amontoados de ferro, instrumentos de produção, bancadas, que se misturam aos operários que circulam por dentro produzindo as ferramentas.
Trajetória
Graciano é um homem guerreiro, lutador e de larga visão comercial. Ele admite que nunca teve habilidade para as letras, chegou a ficar 11 anos repetindo o 2º ano do fundamental, até sua professora desistir dele. “Consegui aprender e ler depois, por causa do comércio, mas quando eu era jovem, só queria inventar algo parta ganhar algum dinheiro”, frisou.
No sítio Jurema, onde a família morava, era um tempo de dificuldades. A comida era à base de milho, pão de milho, mungunzá e feijão, sem tempero algum. Só comiam arroz no fim de semana ou quando chegava uma visita. O arroz adquirido era em casca e tinha que ser pilado no pilão rústico. Só tinham a chance de comer alguma carne quando recorriam à caça de aves e roedores abatidos de baladeira no mato.
Na década de 60, quando chegou a Iguatu, aos 9 anos de idade, saía de casa para ir vender água, café, alfenim e tapioca na estação do trem. Fazia esta tarefa durante a semana, no domingo ia para as águas do rio Jaguaribe lavar carros. Seu pai trabalhava também nas margens do rio Jaguaribe carregando caminhão de areia para ganhar o dinheiro de suprir a comida de casa. Em 1961 foi trabalhar como ajudante na oficina mecânica de seu Cazé. Após aprender o ofício da mecânica, prestava serviços em vários locais da cidade consertando carros. Na época iniciou suas atividades como sucateiro. Começou comprando ferro velho, osso, cobre, alumínio, até que em 1976, um amigo, Elmo Moreno, lhe vendeu uma Rural 68, que ele usou como desmanche e vendeu as peças. Aquilo lhe despertou a ideia de um promissor negócio de sucataria, até evoluir para a fabricação de ferramentas, sua principal atividade econômica. Como ele não dispunha de recursos para comprar ferro velho para desmanchar e vender, era a sogra, Leonor Correia Lima e Raimundo Mariano, da Sorveteria Mariano, que lhe emprestavam dinheiro sem juros, para ele investir no futuro negócio. Quando seu professor, seu Cazé, adoeceu e ficou sem trabalhar, fazia questão de ir semanalmente levar donativos para ele. A solidariedade com o velho mecânico era seu gesto de agradecimento, pois foi com ele que Graciano aprendeu muito, sem ter que pagar nada.
Se o leitor imaginar que Graciano foi só aprendiz de sucateiro, existem outras tarefas que antes cruzaram o caminho dele. Trabalhou na colheita de algodão na região do distrito de Alencar. No bairro Prado, onde morava, não existia esgotamento sanitário. Graciano ganhava dinheiro com um amigo para ‘desgotar’ as fossas das residências. Carregava os dejetos misturados com água em baldes e descartava nas margens do rio Jaguaribe. Esta atividade, lembra ele, era feita à noite, para não chamar a atenção por causa do odor que exalava quando ele e o amigo entravam na caixa de alvenaria abarrotada de fezes. “Para a gente ganhar coragem de entrar, antes ficava bebendo cachaça das 17h até às 21h, quando era pela manhã, fossa ‘desgotada’ e já com o dinheiro guardado, era só tomar um banho com sabonete que o mau cheiro saía”.
No ano de 1990, Graciano foi trabalhar em Fortaleza, numa sucata que comprou na região do porto do Pecém. Viajava de Sobral até Recife/PE, comprando cobre e alumínio para fazer estoque e vender. Ficou na capital até o ano de 2012 quando resolveu vender a sucata e retornar para Iguatu, período em que comprou a área onde hoje é sua empresa e do filho primogênito Adriano, que seguiu seus passos na arte de transformar ferro bruto em ferramentas.
Família
Graciano viveu maritalmente com quatro mulheres, dentre elas Adélia Lucena da Silva, Célia Bastos de Mendonça. Dos relacionamentos nasceram oito filhos, todos profissionais honrados e reconhecidos. Três dos rebentos, Adriano, Graciliano e Otaciano, também aprenderam o ofício com o pai e seguem seus passos na carreira empresarial. Otaciano trabalha com ele, Graciliano tem uma empresa do mesmo segmento em Quixelô, Adriano é dono de uma empresa do mesmo segmento, que funciona num imóvel vizinho à empresa do pai. Outros dois filhos seguiram por caminhos diferentes. Leonora ingressou na vida pública, foi vereadora e vice-prefeita em Quixelô. Desiludida com a política, resolveu sair e investir no comércio. O filho Graciano foi estudar ciências da saúde e se tornou psicólogo. As filhas Tatiana, Talita e Leomara são respectivamente, vendedora, nutricionista e comerciante.
Graciano se tornou não apenas um homem bem-sucedido na carreira empresarial, mas também um líder nato para suas famílias, em especial para os filhos. O maior orgulho que ele tem é dizer que “estão todos bem, economicamente falando”, fruto de trabalho, educação e gestão. “Sou muito grato a Deus, sou um homem abençoado, trabalhei muito duro, e sempre recebi mais do que merecia, por isso sou muito grato, pelos filhos, pela vida, pelo trabalho que nos deu muito”.
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