![Kleyton Bandeira Cantor, compositor e pesquisador cultural](https://www.jornalapraca.com.br/wp-content/uploads/2024/02/WhatsApp-Image-2024-02-23-at-20.35.07-819x1024.jpeg)
Kleyton Bandeira
Cantor, compositor e pesquisador cultural
Quando eu tinha por volta de 05 ou 06 anos de idade, antes mesmo de entender o que era saudade, eu já escutava tão docemente os versos que assim diziam: “não se admire se um dia um beija-flor invadir a porta da tua casa, te der um beijo e partir, fui eu que mandei o beijo…”. Aquilo preenchia meu peito com um sentimento tão bom, mas que só depois de muito tempo eu fui compreender o que era. Escutava no rádio, no toca-fitas, na radiola e, mais adiante, no som 3 em 1. Meus primos Elder e Elber Bandeira, exímios tocadores de violão, também entoavam essa maravilhosa canção nas confrarias familiares.
Eu pensava “como alguém consegue fazer uma música tão linda? ”.
Eu achava tão bonito quando Elba Ramalho dizia assim: “veja você, arco-íris já mudou de cor, uma rosa nunca mais desabrochou”. Mas também não entendia nada. Como um arco-íris vai mudar de cor? Imaginava, eu, um arco-íris preto e braço.
Achava tão poético (apesar de nem saber que essa palavra existia, naquela época), quando Elba dizia com aquela voz maravilhosa: “eu vou partir pra cidade garantida, proibida. Arranjar meio de vida, Margarida, pra você gostar de mim. Essas feridas da vida, Margarida. Essas feridas da vida, amarga vida, pra você gostar de mim”.
“Meus Deus, mas que coisa linda!”.
Só depois de algum tempo, quando ainda jovem, tive que superar 30 dolorosos dias longe do meu pai quando ele viajou a trabalho (acho que aqui foi o meu primeiro contato com a saudade); quando tive que me despedir da minha tia Osvânia que deixara tudo para trás (família, amigos e amores), para tentar a sorte em São Paulo, a terra prometida e proibida), quando sofri o meu primeiro tombo de bicicleta, no ano de 1988, na cidade de Senador Pompeu, só então que fui entender o que sentia quando escutava Ai Que Saudade D’ocê e Veja (Margarida).
Era uma sensação de pertencimento, mas um pertencimento à vida. Eu me sentia vivo ao escutar aquelas canções, mas, ainda bastante jovem, não sabia o que isso significava, por isso não conseguia traduzir aqueles sentimentos em palavras. Aquelas canções não eram apenas canções, eram vida; a vida de centenas de milhares de pessoas, inclusive a minha. Eu só fui entender o trecho da música Dom de Iludir, de autoria de Caetano Veloso, que diz que “cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”, depois de compreender “Ai Que Saudade D’ocê” e “Veja (Margarida)”.
Pois é…
Mas na última quinta-feira, 06/02, o compositor dessas duas obras primas, o paraibano Vital Farias, nos deixou.
Nascido em 23 de janeiro de 1943, no sítio Pedra d’água, município de Teperoá-PB, Vital Farias deixa um legado formidável para todos aqueles que amam a música de qualidade, que preservam o que de tão bom foi construído pela arte de veia nordestina.
Além de Ai que Saudade D’ocê e Veja (Margarida), Vital Farias compôs grandes sucessos como Canção em Dois Tempos (Era Casa Era Jardim), Pra Você Gostar de Mim, Forrofunfá, Sete Cantigas pra Voar dentre tantas outras. Vital também foi gravado por grandes nomes da Música Popular Brasileira, como Fagner, Elba Ramalho, Zeca Baleiro, Geraldo Azevedo, Zé Ramalho, Fábio Júnior, Lucy Alves, Alceu Valença, Xangai, Gilberto Gil, Capinam dentre outros.
Além do trabalho artístico, Vital tentou, por duas vezes, em 2006 e 2010, se tornar senador da República pelo estado da Paraíba. No entanto, não obteve êxito em nenhuma dos pleitos.
Vital Farias foi uma daquelas pessoas que deixa os palcos da vida com a sensação de missão cumprida. Valeu muito a pena viver, Vital. E o tempo se encarregará que tu vivas eternamente!
Muito obrigado por me ensinar tanto.
Continuemos, agora, de onde estamos!
Bom fim de semana e Vital Farias vive!
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